Segunda-feira, dia 29 de Abril de 1974
É uma segunda-feira mas não é uma nova semana, é uma semana nova. Temos a sensação de que tudo é novo, tudo é possível, de que afinal se quebrou o «fado», o terrível fatalismo que nos fazia ver sempre tudo negro.
Ajuda bastante não apenas o que se vai ouvindo na rádio e vendo na TV, mas sobretudo o que se vai vendo da repercussão destes acontecimentos ‘lá fóra’. Vermos que grandes estações estrangeiras abrem noticiários com notícias sobre Portugal e tão elogiosas, é coisa a que não se está habituado e sabe tão bem!... Com a liberdade de imprensa vemos por todo o lado repórteres estrangeiros à procura de mais um testemunho, de um pormenor, de um dado novo.
E nós sabemos ainda tão pouco! O «Programa do MFA» (a sigla que se começou logo a dizer, só nos primeiros comunicados se falava do Movimento das Forças Armadas) é um documento ainda extenso. Sabe-se que foi redigido por um grupo de militares que sabiam bem o que estavam a fazer, mas fala-se de nomes como Vítor Alves, Melo Antunes, Victor Crespo, Charais, que ouvimos agora pela primeira vez. O nome que se ouviu mais, desde o princípio foi o do estratega deste golpe, um capitão (nem sei se é capitão?) chamado Otelo.
O Programa tem umas medidas ‘imediatas’, tal como a formação da tal Junta de Salvação Nacional que vai gerir o país até se formar um Governo Provisório Civil, e depois umas medidas ‘a curto prazo’, que implica escolher-se nessa Junta quem vai ser o Presidente da República, também provisório. Isso de se falar logo em Governo Provisório Civil, sossegou muita gente que já estava a imaginar que se ia cair de novo numa ditadura militar, mesmo que de outro quadrante. Mas eles falam em devolver o poder ao povo, em eleições, numa Assembleia Constituinte para se criar uma nova Constituição, e tudo isso são sinais muito positivos.
Esta coisa de não haver «vedetas» neste Movimento é uma das coisas bem simpáticas. Conta-se por aí que alguém perguntou:
Quem manda aqui? Resposta:
“Mandamos todos!”
Mas quem é o mais graduado? Resposta:
“Somos todos capitães!”
Lindo.