segunda-feira, janeiro 04, 2010

Queixas ou queixinhas

É curioso como nós apreciamos tanto fazer queixinhas mas evitamos fazer queixas. Já há bastante tempo li um estudo qualquer onde se confirmava que os portugueses são dos povos que menos queixas fazem (queixas ‘a sério’, fundamentadas, com consequências)
Achei interessante este aspecto do nosso medo de nos queixarmos a sério. No início do mês passado, escrevi para aqui um post, chamado «Consultas a tempo e horas» e ironizava um pouco porque me parecia que o tal «tempo e horas» era excessivamente tolerante e uma pessoa poderia ficar seriamente doente antes de chegar ao momento de ser avaliada pelo especialista.
Curiosamente, este fim de semana, encontrei outra notícia na mesma linha:
Há um ano que os utentes do Serviço Nacional de Saúde têm um tempo máximo de espera para serem atendidos, [passado o qual a instituição pode ser multada,] mas são ainda poucos os que reclamam - apenas «meia dúzia» - apesar dos atrasos serem muitos
Segundo essa norma com mais de um ano, um doente não deve poder esperar mais de 15 dias úteis por uma consulta num centro de saúde, e para renovação de medicamento só deve esperar 72 horas.
O interessante é que como as queixas foram por aquilo que ali se diz meia dúzia, naturalmente que o sr. Presidente da ERS rejubila, tem na sua frente a prova de que tudo está a funcionar bem! Tem de ser. Ou então havia mais queixas...

O que é que vos parece?
Antigamente (e talvez agora também, não ando muito atenta) havia uns homenzinhos que montavam umas bancas junto do Arquivo de Identificação Nacional, para ajudar os meios analfabetos que iam tirar o seu BI mas olhavam para os papeis que tinham de preencher como boi para palácio. Esses senhores das bancas lá apuravam a sua caligrafia e o candidato só tinha de assinar no fim e, claro, pagar o trabalho do outro. É que de facto a escrita nunca foi uma grande qualidade nossa.
Assim é o mistério das queixas formalizadas!
Se os ‘chico-espertos’ se lembrassem de montar umas bancas dessas junto dos CNS, se calhar a tal meia dúzia de queixas sofria um aumento exponencial. Ou talvez não. Talvez apenas com a ‘ameaça’ de que a queixa se concretizasse a coisa acelerasse de repente.
Não me esqueço a única vez em que pedi um «Livro Amarelo». Estava cheia de razão, é claro, mas ainda teria ‘fechado os olhos’ (o tal bom feitio português) se me tivessem dado uma explicação amável. Mas perante a grosseria da resposta, limitei-me a dizer secamente «pode fornecer-me o Livro Amarelo?». Fez-se um silêncio gélido e fui conduzida através de vários gabinetes, que aquilo devia estar bem guardado. Só vos digo, que assim que me sentei com o livro à frente, e ia destapar a caneta, tinha ao meu lado alguém ofegante que tinha vindo a correr com o meu problema resolvido!!!
Ou seja, queixinhas fazemos desde crianças, e não vamos longe.
Queixa séria e fundamentada talvez altere alguma coisa.


14 comentários:

fj disse...

Parece verdade, parece realmente que é assim. O exemplo dado é giro. Pessoalmente nunca me "atrevi" a pedir tal livro.Sou medrozito e de brandos costumes.

fj disse...

"A minha Pátria é" os meus brandos costumes ( ou a nossa...).Teorizar sobre o medozito dá-lhe outra dimensão, e mostra cultura ( PS:a propósito Joaninha tens estudado a complexa ortografia portuguesa?).

Joaninha disse...

Precisas de umas lições, fjzinho....? É que a minha ortografia é super impecável, ás vezes lá cai uma gralhazita sobretudo quando escrevo muito depressa... Mas este caso do diz o «completamente nu ao roto», é que é de pasmar, ó criatura!!!!

Quanto às queixinhas é mesmo assim. Em todo o lado. Vamos fazendo a queixa a quem está ao nosso lado na fila, mas quando chegamos ao guichet é tudo sorrisos. E nestas coisas de saúde e educação há a ideia de que «se nos queixamos ainda é pior!»
........
E se calhar é!

sem-nick disse...

Tens razão. Uma queixa verbal custa pouco, é um 'desabafo', mas escrever aquilo que consideramos que estamos lesados é bem mais chato.
Dá muito trabalho...

Mary disse...

Pões o dedo numa ferida importante.
E o giro é que reconhecemos que é assim mas depois.... deixamo-nos ficar!
Todos nós conhecemos histórias espantosas de irmos 'amochando' por timidez.

josé palmeiro disse...

Já aqui contei uma situação que redundou em Tribunal, com incómodos para toda a família mas que resultou em condenação do que foi objecto de reclamação, e isto foi com um dos meus filhos, sendo eu testemunha. Ele reclamou, para isso pediu não o livro amarelo porque era um restaurante, mas escreveu e ganhou, foram uns tempos longos de espera, (na justiça é assim, mas ganhou. Provavelmente deveria, eu, ter pedido o tal "Livro Amarelo", para escrever sobre s demora e consequentes prejuízos que ele provoca!!!

Unknown disse...

palavras para quê?, se já está tudo dito ou quase. mas na verdade eu uso o livro amarelo, refilo com conta, peso e medida (qb) e fico a espera da resolução do problema exposto. claro que há pessoas, que se limitam a refilar, no sentido da palavra, mas não passa disso mesmo. refilam, mas para dentro.
mas é engraçado,que quando devem tentar e esforçar-se por resolverem as questões, empurram para os outros... e ficam felizes.
é. se os outros resolvem, porquê eles chatearem-se?
a pátria dos brandos costumes???, oh! desculpa lá fj, mas onde mora isso? só se for num país imaginário...
a joaninha tem razão, tem. bravo! como se diz no teatro!
uma lição de humildade não fica mal a ninguém, e parece que há quem precise urgentemente, não é?
quanto a questão real, que coloca emiéle, tem razão. mas as consultas são mesmo para quem tem dinheiro, pilim, cacau...
quem tem vai ao particular, quem não tem espera sentado e desespera, e quando chega a "cartinha" do hospital o "utente", que sim ser doente ou estar doente, neste país é um luxo, já o dito se finou. quanto ao zé palmeiro, espero que esteja hoje mais animado, e parabéns pela corajem de colocar essa gente em tribunal.
é que realmente ninguém pode, ninguém deve calar a voz da indignação. já bastava antigamente.
desejo a todos uma boa semana de trabalho, já que tem de ser. e aos ociosos(?), se os houver, bons projectos e que aproveitem e vivam la vida!
...vou tentar viver a minha....
silvya

Unknown disse...

Emiele, ainda aqui volto de fugida, para lhe dizer obrigada, pelo comentário que deixou ontem(?), mas só hoje vi...
sou recente aqui no populo, mas já me custa não vir cá.
tornou-se uma espécie de droga, no bom sentido. como o chocolate e o café...
obrigada
silvya

Unknown disse...

Emiele, ainda aqui volto de fugida, para lhe dizer obrigada, pelo comentário que deixou ontem(?), mas só hoje vi...
sou recente aqui no populo, mas já me custa não vir cá.
tornou-se uma espécie de droga, no bom sentido. como o chocolate e o café...
obrigada
silvya

Anónimo disse...

É claro que sim.
Somos mesmo um pais de queixinhas, e ficamos muito aliviados quando dizemos o que pensamos aos colegas, aos amigos, até aos desconhecidos dos transportes, à família, mas NUNCA a quem devia ouvir a reclamação...
É feitio.
E o senhor director do ERS fica todo contentinho porque só encontrou meia dúzia de reclamações...

cereja disse...

Quando eu faço estes comentários mais ou menos críticos não quero de modo nenhum dizer que 'salto fora da carroça'! Sou igualzinha! Também nunca peço livro de reclamações (prefiro não voltar àquela casa) e se contei esse caso do Livro Amarelo é porque ultrapassou tudo o que a minha paciência aguentava.

O que penso é que não se pode tirar conclusões em como seja o que for está a funcionar bem, apenas por não haver queixas. Tem de haver outros modos de avaliar...

kika disse...

Pela noitinha, apenas para dizer que efectivamente ainda somos um país de brandos costumes, e por vezes não sei se isso é bom ou mau....
Pessoalmente acho bem que se reclame, mas tb sou um pouco preguiçosa...embora já o tenha feito!

fj disse...

Silvya tens razão pá. No meu delirio confundi-me com a pátria.Eu sou de costumes brandos, ela não é nada.
Joaninha a tua situação real é o inverso . ás vezes escreves bem. Eu não erro, a minha escrita tem uma base teórica rica, baseae corta-se o inutiliada na facilitação e evitanço de desperdícios, com profundo alcance na alfabetização, assim muito mais rápida. Ou explica-me porque é é não porque è? e travassos e não travaços, com o que se poupa logo uma letra, no fim de cada ano a inutilia poupada é (è?) muita.e se te apetece citar Peçoa não o faças, pobre lingua ou pátria...

cereja disse...

Ai, fj, no novo acordo é que te vais de poupar letras inúteis... Tudo o que não se ouve não se escreve, pelo que percebi...