Lisboa(s)
É um tema recorrente aqui no Pópulo, a minha certeza de que esta cidade é uma linda manta de retalhos. Cada bairro é um retalhinho, como que uma 'aldeia', com as suas características próprias, que vive paredes-meias com várias outras ‘aldeias’, os bairros seus vizinhos, semelhantes mas com outras características.
Ainda a semana passada tive essa confirmação, de que afinal, mesmo com o metro quase à porta aqui se vive em certos aspectos num outro mundo.
O meu prédio é pequeno e com excepção de 2 vizinhos recentes, todos nos conhecemos há bastante tempo. Sabemos os nossos nomes, o nome dos filhos, o que cada um faz, embora eu seja pouco sociável (apenas com a vizinha do lado já troquei umas curtas visitas) dou-me bem com todos.
Aconteceu que a vizinha de baixo sofria de uma grave doença neurológica e morreu uma destas madrugadas. Eu nem dei conta da vinda do INEM, nem de nenhum ruído fora do normal - foi a porteira que me comunicou o acontecimento. Como me competia passei pela capela mortuária (já aqui na rua das traseiras) a cumprimentar o viúvo e os filhos, mas não estive tempo nenhum porque afinal era apenas uma vizinha e a hora era para a família. No dia seguinte, voltei a passar por lá com a ideia de estar uns minutos, até o caixão sair e depois também me vir embora.
Mas…
O certo é que os outros vizinhos também lá estavam e à saída, a do meu patamar ofereceu logo «Podem vir comigo, para não irem 2 carros! E a D.***** também!» (era a porteira). Fiquei atrapalhada, de facto o cemitério era muito perto e não encontrei desculpa para não ir.
Já esta parte da história vai ao arrepio das ideias feitas que há sobre Lisboa como uma terra onde as pessoas não se conhecem umas às outras, e reina grande frieza entre os vizinhos que nem os bons-dias dão. Mas o curioso, foi que quando o carro funerário avançou, as minhas ‘colegas de boleia’ ficaram escandalizadas: «Olhem para aquilo! Então não parou nem um minuto aqui à porta do prédio?! Parece impossível!»
Mais tarde ao contar esta história, encontrei amigos meus que nem conheciam o costume provinciano de, na última viagem, a carreta parar um pouco em frente da porta do falecido… mas, pelos vistos, aqui no meu bairro ainda se esperava essa cortesia.
Outra Lisboa, muito mais provinciana.
Ainda a semana passada tive essa confirmação, de que afinal, mesmo com o metro quase à porta aqui se vive em certos aspectos num outro mundo.
O meu prédio é pequeno e com excepção de 2 vizinhos recentes, todos nos conhecemos há bastante tempo. Sabemos os nossos nomes, o nome dos filhos, o que cada um faz, embora eu seja pouco sociável (apenas com a vizinha do lado já troquei umas curtas visitas) dou-me bem com todos.
Aconteceu que a vizinha de baixo sofria de uma grave doença neurológica e morreu uma destas madrugadas. Eu nem dei conta da vinda do INEM, nem de nenhum ruído fora do normal - foi a porteira que me comunicou o acontecimento. Como me competia passei pela capela mortuária (já aqui na rua das traseiras) a cumprimentar o viúvo e os filhos, mas não estive tempo nenhum porque afinal era apenas uma vizinha e a hora era para a família. No dia seguinte, voltei a passar por lá com a ideia de estar uns minutos, até o caixão sair e depois também me vir embora.
Mas…
O certo é que os outros vizinhos também lá estavam e à saída, a do meu patamar ofereceu logo «Podem vir comigo, para não irem 2 carros! E a D.***** também!» (era a porteira). Fiquei atrapalhada, de facto o cemitério era muito perto e não encontrei desculpa para não ir.
Já esta parte da história vai ao arrepio das ideias feitas que há sobre Lisboa como uma terra onde as pessoas não se conhecem umas às outras, e reina grande frieza entre os vizinhos que nem os bons-dias dão. Mas o curioso, foi que quando o carro funerário avançou, as minhas ‘colegas de boleia’ ficaram escandalizadas: «Olhem para aquilo! Então não parou nem um minuto aqui à porta do prédio?! Parece impossível!»
Mais tarde ao contar esta história, encontrei amigos meus que nem conheciam o costume provinciano de, na última viagem, a carreta parar um pouco em frente da porta do falecido… mas, pelos vistos, aqui no meu bairro ainda se esperava essa cortesia.
Outra Lisboa, muito mais provinciana.
10 comentários:
Giras as imagens, descnhecia o costume.
Era costume de província, é claro.
Mas é interessante como há muitas Lisboas dentro da Grande. E quando os prédios são em condomínio ainda é natural que as pessoas se conheçam, pelo menos das reuniões, mas este é um prédio que... pertence ao senhorio. Mas há de facto uma grande proximidade.
Tens razão.
Há Lisboa, e Lisboas.
Quem habita nos enormes prédios tipo HLM (para relembrar a França) que se vêm quer mais para a periferia, quer em bairros novos, não tem nada essa ideia da solidariedade que se pode sentir em bairros mais antigos.
O costume, conhecia-o só de ouvir falar. Nunca vi.
Vives cá numa zona animada, heim?!...
Claro que esta história é um pouco triste, mas como dizes que até tinhas uma relação distante com a senhora, a coisa foi mais formal. E tem muitíssima graça, essa de se esperar que numa rua de Lisboa se cumpra um ritual desse tipo. Só visto.
Bom a Lisboa,Lisboas ,é dos livros.Pelo menos dos Cardosos Pires e Dos Silva Carvalhos e das crónicas de Campo de Ourique do Silva Tavares e do Lobo Antunes do BB ou do Dinis Machado.E até nestes tidas umas mais que outras.O que significa que sendo do dominio da Ficção...Mas o curioso é que a Emiele "fure" rapidamente o que acabou de nostalgicamente constatar.Pira-se assim que pode.È como o poema do Cesariny."venha cá ver o povo/já vi".Acho que a transcrição não está correcta mas a minha memória já não é o que era.Gira,gira é a mantinha de patchwork.AB
Meti para ali um "tidas" que deveria ser "todas".Confesso que ando a ver "ao lado".AB
A história é interessante, e eu sinto o mesmo que a Emiéle quando falo com alguns amigos que vivem lá nas periferias, e dizem que não se reconhecem nesta cidade. é uma aldeia, é!
BOA, queridíssima e certeira, AB! Ela fala, fala, mas assim que pode, pira-se para «a outra aldeia» a que tece bastos elogios.
Pois, pois...
São imagens de uma colcha de retalhos, não são?
Bem Lisboa é mesmo isso que dizes. Pelo menos, na minha modesta opinião e experiência, do tempo em que por aí vivi.
Quer parecer-me que esse é um dos maiores trunfos da nossa grande metrópole e uma mais valia do nosso povo, em grande parte a viver na grande metrópole mas sempre com o seu "cantinho", muito presente.
Por algum motivo eu transportei para os Açores, grande parte das matrizes alentejanas.
Eu sinto isso tal e qual!!!
E é uma chatice porque tendo tido de mudar de casa, e passar-me para mais longe, onde estou é muito bonito, mais perto das praias e essa coisa toda, mas não consigo aqui o ambiente que o meu velho bairro me dava!
Claro que a gente sabe que vários escritores focaram o tema e muitíssimo bem, mas esta historieta da Emiéle veio recordar como estes nichos podem perdurar no meio dos tais HLM ou pseudo-arranha-céus...
Como o costume já perdido no tempo de guardar os mortos por um período superior a sete dias, não fosse ele despertar de um qualquer súbito torpor.
Outros tempos, nos quais o senso de humanidade era uma coisa, chamemo-lhe, mais concreta e, porque não, mais vivida.
Hoje temos todos muita, muita pressa e não se sabe bem de quê...
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