Um Caderno de Capa Castanha XVII - O Natal
E quanto ao seu Natal?
«O Natal era uma época um tanto misteriosa nas minhas recordações mais antigas.
É claro que nem vale a pena insistir no facto de que era muitíssimo mais caseiro e sem a insistência nas prendas que hoje se vê. Na minha recordação, pelo menos, era uma altura onde as compras que eu via fazer eram sobretudo ‘alimentares’, a pensar na noite da consoada e na ceia de Natal.
A minha família próxima era pequena. Os meus pais tinham apenas um irmão cada um deles, eu tinha um tio paterno e outro materno mas quando era pequena, eles ainda não tinham filhos, nem sequer eram casados, era uma família muito pequena para a época. Contudo, na minha casa, havia «ambiente de festa» – não muito mais do que uns 15 dias, aí uma semana antes do Natal e depois mais ou menos até ao Dia de Reis mas sentia-se que a vida tinha outra animação.
Até aí cerca dos meus 6 ou 7 anos, eu não só acreditava no pai Natal, como até sabia que era ele que trazia a Árvore de Natal. Ia para a cama no dia 24, excitada e nervosa, e a minha casa estava como de costume – bonita, florida, bem cheirosa, mas como seria normal. Ao acordar do dia 25, corria à sala e lá estava a Árvore com dois ou três presentes sempre desembrulhados! Hoje penso que vinham sem embrulho porque era suposto que não passavam por nenhuma loja, caíam directamente do saco do Pai Natal para ali…
E esse mistério de 'ele' conseguir trazer a Árvore, era maravilhoso. Imaginava-o no trenó, com as renas, a voar no céu e no seu braço esticado a minha Árvore já prontinha e com as velas acesas! Naquele tempo a iluminação era feita com umas velas pequeninas que se encaixavam nuns suportes com umas molas que prendiam nos raminhos. Nada eléctrico ainda. E, a verdade, é que essa Árvore era também como que uma prenda. Deixei de acreditar no Pai Natal uma célebre noite onde, de sono mais leve, ouvi risos na sala fui lá dar em camisa de noite e apanhei o «pai e mãe natal» em flagrante montagem da árvore…
Quanto às prendas nunca foram em grande número e creio que nem era por falta de dinheiro dos meus pais, não era costume. Não me recordo de mais de 3 ou 4 – uma boneca, um jogo de tachinhos, vestidos da boneca, um dominó com animais, já era muito bom. Aliás também não precisava de mais para brincar. E, o costume era procurar essas prendas na manhã do dia 25.
Dia 24 íamos a casa dos avós maternos fazer a consoada. Avós, tios, os meus pais, uns tios avós mais idosos, uns primos mais distantes que, por acaso, aparecessem mas o grupo não era muito grande. Esse jantar era de bacalhau, porque o meu avô era minhoto e preferia assim. Eu não tinha muito apetite, gostava era da mesa linda, muito bem decorada, porque esta minha avó era excelente nisso. Depois, na ceia de Natal, dia 25, íamos a casa dos outros avós, que davam mais importância a esse dia. Essa mesa ao contrário da véspera, não tinha grande decoração mas a comida era um exagero! Estes avós, alentejanos, faziam uma mesa de Natal que devia dar para um bodo. A avó embebedava o peru, e lembro-me de a ver matá-lo na cozinha e ficar horrorizada! Depois de cozinhado, sabia-me bem, mas a morte do animal era terrível. E nessa casa, que já cheirava a comida excelente ainda se vinha na rua, a animação era muito grande porque embora filhos só fossem os meus pais e tios, apareciam muitos cunhados, sobrinhos e era uma festa onde a minha avó parecia uma rainha! Na noite de Natal ela reinava naquela casa, só lhe faltando o manto e a coroa. E eu, de olhos muito abertos, maravilhada. Aquilo era Natal.»
Clara
17 comentários:
Claro que tinha de ser...
Tens apontado sempre para fazer coincidir o «tempo das recordações» com o tempo real.
Que belo Natal...
(sabes que me tinha esquecido, mas realmente os nossos brinquedos não vinham embrulhados. Esta do papel e fita não é dos anos 50.
:))
Tal e qual!
Tirando essa fantasia de ser o pai Natal que trazia a Arvore, o reto parece a papel químico das minhas recordações.
Bem, já dei uma volta por aí e deve andar tudo a dormir as horas atrasadas porque aqui pelo Pópulo só mesmo os que assinam o ponto todos os dias.
E eu chego atrasada!!! (também tenho direito a dormir mais umas horitas...)
Mais um post do Era uma vez... e mais uma vez recuamos 50 anos.
Natais familiares, sim senhora. As prendas. muito mais reduzidas, era para as crianças. Talvez o pai e a mãe trocassem entre si, mas eu não reparava e de qualquer modo era com discrição. Nada, mas nada a ver, com o consumismo desenfreado que esgota cartões de crédito nesta quadra!!!
Eu sinto que por um lado entendo as pessoas que detestam estes «encontros por obrigação», mas não deixas de ter razão, as pessoas que realmente não se querem ver, arranjam qualquer desculpa e não aparecem... E os que vão é porque mesmo uma vez por ano sentem alegria em se reunirem.
São mesmo outros tempos!!!!
Estou como a Mary, tudo igual, menos a árvore de Natal. Em minha casa e dos meus tios e tias, era hábito, fazer-se o presépio, que tinha rituais muito engraçados, como ir ao musgo, corriamos as muralhas de Estremoz e os olivais, aqueles mais velhos, com oliveiras, centenárias, que tinham um musgo especial e muito limpo. Depois era a construção do presépio com os materiais naturais que procuravamos, como a cortiça, as pedras, e os nossos bonequinhos de Estremoz, feitos pelas mãos hábeis dos que davam alma ao barro, como a "Ti Ana das Peles" e os Irmãos "Alfaçinha". Recordáste-me uma coisa que me não lembrava, mas ue era exactamente, como dizes, as molinhas com o suporte psrs as velas, que também usavamos nos presépios, enfim, como diz o Raphael, coisas de outros tempos...
Off topic: deixei no Fliscorno o desafio para divulgar a questão dos recibos verdes/falsa prestação de serviços.
Aproveito para desejar boas festas.
Essa da morte do perú, já estava esquecida, mas era uma violência para uma criança.
Quanto à festa, lá em casa também havia presépio com bonequinhos e era giríssimo!
Bom aproveito para desejar Bom Natal a toda a gente daqui do Pópulo(O Zé Palmeiro...os irmãos Alfacinha...)e dizer que não cumpro nem em tempo real nem nada que se aproxime o que prometi de comentários posts aqui para a èmiele.Tinha como toda a gente muitas estórias mas não supero particularmente bem a época.Logo beijinhos,boas consoadas e até ao meu regresso...AB
Mais um para a nossa boa colecção dos «Era uma vez...»
Acaba aqui o Natal mas talvez venha aí um reveillon, quem sabe?...
;)
Estou como vocês, tudo bem ,mas dispenso a morte do perú. Não sou vegetariano, mas prefiro não assistir a essas coisas.
Uma coisa é um bife de porco, vaca, perú, outra ver os animais ao vivo e a cores!!!
Quanto às prendas acho que as crianças de hoje exageram. É que nem dá para brincar com tudo e vem aí um fastio que dá para enjoar tudo...
Com uma referência especial para a AB, vou deixar no "Estounasesta", a foto de um "presépio de altar", das barristas que actualmente estão a fazer coisas, muito boas e bonitas.
Não conhci esste tipo de Natal, mas tive outros Natais de sonho de que me recordo com saudade. Espero sinceramente que nos recordemos daqui a uns anos também da felicidade deste e de todos os Natais futuros.
Feliz Natal
Rui V.
Obrigado a todos!
Bom Natal para ti, Rui, e quanto à questão dos «recibos verdes» não tinha reparado que havia uma petição e é claro que vou fazer eco!
O teu presépio é uma beleza, realmente, Zé Palmeiro, mas creio que a AB vai estar longe da net estes dias, não sei se o irá ver. Não fiques desapontado.
Zé Palmeiro fui ao "estounasesta" e só não comentei ou seja ,comentei, mas é preciso fazer tantas coisas, tantas vezes, que desisti.Muito obrigada pela referencia e as figuras são lindas.Como lá já tinha dito tenho uma bilha de ornatos de flores mas algumas estão partidas.Tenho de arranjar outra.Bom natal.AB
Venho pois desejar
votos dum feliz Natal
este que vai festejar
é o meu desejo pessoal
Um abraço
Raul
Boa noite Emiele, Voltei a ler os diversos comentários de Dezembro e gostei, como sempre. Não tenho tido tempo para ler Blogues mas lá decidi fazê-lo hoje. Desejo-te/vos uns dias agradáveis, quer sejam festivos ou de outra forma qualquer...Também tenho boas recordações dos Natais passados na província bem a sul quando era criança: acolhedores, agradáveis, gostosos, com galinha caseira, canja, filhoses com mel, arroz-doce, figos torrados/assados no forno e recheados de amêndoas ou nozes...Umh...com prendinhas simples mas para mim espectaculares...Aqui nos países baixos é um pouco diferente. T6em a tradiçào de celebrar o 25 e 26 de Dez., aos quais chamam primeiro e segundo dia de Natal. Logo contarei quando passarem as festividades. Vou ler um pouco e depois dormir porque amanhã ainda tenho de trabalhar. Boa noite. Lia
Olá Raul Congeminações e Lia.
Obrigado ao poeta, e votos retribuidos, desta que não verseja com tanta facilidade...! :D
Lia, tenho sentido a falta da tua presença nestas caixa, mas sei bem que «a nossa vida não é só blogs»! Só recentemente com a minha «prima dinamarquesa» tive conhecimento desse "segundo dia de Natal" também com comidas especiais e tudo.
Tão perto (mesmo dentro da Europa estamos perto) e tão longe em tanta coisa...
Vai aparecendo.
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