quinta-feira, setembro 17, 2009

Útil para quem?

A semana passada uma grande amiga minha foi operada.
Operação delicada, à coluna, que felizmente correu bem mas deu para preocupar a família e os amigos. Eu acompanhei-a o mais que me foi possível, e estava no quarto do hospital quando a levaram para dar a anestesia, aí pelas 7 da noite. A operação ia durar cerca de duas horas pelo que, fazendo umas contas de cabeça, deviam ser perto das dez da noite quando devia estar a dar entrada no recobro. E era aí que ia ficar o resto da noite, em observação.

No dia seguinte contou-me que depois de instalada na cama tentou relaxar-se e dormir mas não o conseguia porque do outro lado da cortina que rodeava a cama ia grande galhofa, com pessoas a conversar alto, a contar piadas e rindo de gargalhada. Bem, é verdade que um clima de boa disposição é agradável e simpático num hospital para afastar ideias tristes, mas conversar alto junto da cama de uma recém operada não é recomendável. A minha amiga, que é pessoa educada, diz que ainda hesitou um pouco mas decidiu-se e pediu: «Desculpem, não se importam de falar mais baixo?». Com surpresa ouviu uma das vozes responder-lhe «Mas ainda é muito cedo!». Ficou estupefacta, e só lhe ocorreu responder «'Cedo' para quê»?!» Numa sala de recobro não deve haver horas para se baixar a voz, calcula-se.

É que há expressões que deviam ser repensadas.

Estou a lembrar-me do «voto útil».

Já o pratiquei, e mais de uma vez. Não é voto a favor de nada, é voto contra qualquer coisa. É o temor de que entre dois males um seja maior do que outro e portanto... mal-por-mal-antes-este-que-é-menos-mau. Não é um voto de convicção, é de medo.
Como disse, não atiro nenhuma pedra porque os meus telhados são de cristal fininho, confesso que já usei essa coisa do voto útil diversas vezes e fiquei muito aliviada quando verifiquei que com isso exorcizei o que temia mais.
Mas também já aconteceu (várias vezes até) que, afinal, a maioria pensava de um modo diferente de mim e quem ganhou foram “os tais” que eu temia. Nunca foi bom, é claro. Quase sempre se confirmou que havia razões para esses receios e, no movimento pendular que são os ciclos eleitorais, da próxima a oposição estava reforçada até ganhou com maior diferença.

E cá resistimos.
É por isso que estou cansada desse tal voto útil.

Para quem é útil?
Para o partido que o recebe, sem saber reconhecer que afinal aquilo é um engano? Para quem votou? Para o povo em geral?

Não. Claro que entendo as razões de quem mais uma vez vai votar útil, mas eu não.


Desta vez não.


16 comentários:

fj disse...

Entendo bem o que dizes. Só me ocorre aqueles jogos muito maus, empatados a zero até ao fim e que já no período de descontos um jogador mete um golo na própria baliza.
Legalmente um deles ganha o jogo.
mas mereciam perder os dois!
O voto útil é como esse tipo de jogo - ganham mas... deviam ter a modéstia de entender o que isso quer dizer.

Mary disse...

Não sei, Emiele, não sei.
É que há votos que são mesmo «inúteis» e não quero cair nessa.

fj disse...

Não é inútil mary, se expressou a tua vontade, aquilo com que concordas mesmo que sejas uma minoria das minorias.
Afinal para isso é que se pergunta de quem gostamos mais e se aceitam muitas candidaturas.
Na América há só dois, mas mesmo em Inglaterra temas mais opções.

Anónimo disse...

Que engraçado, nem de propósito o Farpas disse o mesmo por outras palavras!

fj disse...

Sobre o recobro é espantosa, nem é comentavel...
Voto útil:não critiquemos, telhados frgeis. Em geral percebo-o, já o pratiquei, impossivel desta vez, por enquanto,afasta-lo completamente.Mas

não deve vir a ser preciso.Mas desétiquemos tal voto.

Anónimo disse...

Para quem não der com ele na coluna do lado está AQUI.
Tem piada ver a coisa dita 'à farpas' :)

kika disse...

Recobro, sem comentários...
Não haveria nesse hospital um cantinho ,mais privado e sossegado?
Ás vezes penso que há profissionais na saúde com pouca vocação para o ser.
Por elevada que seja a ocupação deviam reservar um espaço por horas para quem sai duma operação tão delicada, mas humanismo precisa-se.
Voto útil , não sei o que isso é , nunca o utilizei e não será desta vez que o farei!

Joaninha disse...

Essa do recobro é espantosa. Como se aí houvesse 'horas' para baixar a voz e horas para falar alto !!!!
O «voto útil» já o usei muito.
Até muito, e houve vezes em que valeu a pena. Acho que toda a gente já teve alturas em que votou sem ser no seu primeiro candidato, por exemplo na segunda volta das presidenciais, estou a lembrar-me agora.
Desta vez estou hesitante. Exactamente por aquilo que dizes: afinal já passamos por governos de direita, até com maioria absoluta e sobrevivemos!

josé palmeiro disse...

Fizeste bem em falar da tua amiga e da operação que sofreu, não por causa do recobro, que é duma indignidade assustadora, mas por causa da "coluna", essa estrutura ossea que falta a muita gente, na hora de votar.
Tenhamos, "COLUNA"!!!

cereja disse...

Só uma explicação em relação à sala de recobro e o tagarelar dos técnicos: primeiro, isto passou-se num excelente hospital particular. Que de resto é mesmo excelente, mas... há estes deslizes. Segundo, houve logo uma outra voz que interveio dizendo «a senhora tem toda a razão!» e passaram a falar baixinho ou pelo menos a minha amiga não os ouviu. A resposta é que foi espantosa.
Quanto à coluna vertebral, caro Zé, há quem meta outros valores à frente, tal como um bom emprego que agora anda a dar jeito...

sem-nick disse...

Gostei muito da imagem.
Não é 'chover no molhado', nem 'quem anda à chuva molha-se', neste caso quem se molha é quem imagina que se protege!!! Bem achado, e diz tudo.

Anónimo disse...

O facto que relatas, da tua amiga, é de bradar aos céus - o que vale é ainda haver bons profissionais que não se comportam assim.
Votarei "útil", a meu ver, numa perspectiva futura, sim, pensando nos meus filhos - para que possam usufruir de uma vida melhor, porque eu, provavelmente, não estarei cá para ver...Este "meu" voto, não será só meu espero:))

Anónimo disse...

Emiéle, desejo melhoras para a tua amiga.

(Não lhe tirei,como sugeriu o fj,mas, sim, dei-lhe outra "etiqueta")

cereja disse...

Obrigada Maria, a minha amiga reagiu bem (é a segunda que faz em dois meses...) e até acentuou que tirando essa resposta parva foi atenciosamente tratada. Eu comprovei. Mas não resisti a contar essa tal resposta, que ainda por cima foi dada a uma hora tardia afinal de contas!!!!

Acredito que o teu voto seja «útil», e que o seja o de todos nós por ser sincero. Afinal até o voto branco pode ter utilidade em declara uma vontade. E como disse o fj se calhar devemos «deséticar» esta coisa e votar em quem nos apetece.
Obrigada sem-nick, era isso que eu queria significar: às vezes em vez de proteger ainda nos deixa mais molhados...
Zorro essa do golo na própria baliza é das coisas mais enervantes em futebol. E acontece, oh, oh!!

saltapocinhas disse...

Eu também não!
Estou mais ou menos decidida a votar num dos pequeninos...

cereja disse...

E eu aprovo-te! Há que animar os pequeninos, e tu não és professora...? :)