terça-feira, abril 14, 2009

Traduções impossíveis

Há muitas questões idiomáticas que só que domine muito bem uma língua pode ultrapassar, como todos sabemos.
Mas ontem reparei que há coisas que, por melhor que se domine a língua de outro país, obrigatoriamente nos (lhes) escapam.
Por exemplo os pregões.

Ia distraidamente na rua quando ouvi uma cantilena típica «É p’ra hoje! É p’ra hoje!».
Típica para mim. Nem era preciso ouvir «está quase a andar» por exemplo para saber do que se tratava, que a entoação do pregão é inconfundível.
Mas imaginaram um inglês, francês, italiano, alemão, a ‘traduzir’ aquilo à letra? O que raio seria «para hoje»?! O que é que o homenzinho quereria dizer?!
Também é verdade que é quase só o pregão que ainda resta. Por acaso na minha zona ainda passa às vezes o amolador (de facas e tesouras) que toca uma gaita de beiços também característica e no Outono ouve-se às vezes por aí o «Quentes e boas!» (também com uma tradução que pode levantar dúvidas...)
Mas já não oiço o «viva da costa!!» (também intraduzível) nem o «figuinho de capa rota!», nem coisa nenhuma dessas.

Se quero comprar alguns desses produtos vou ao supermercado, e aí fala-se a mesma língua, ou antes - nem se fala língua nenhuma...

10 comentários:

fj disse...

It is for today, it is for today, não dava?

fj disse...

It is for today, it is for today, não dava?

Anónimo disse...

:)

Também comecei a experimentar «c'est pour aujourd’hui...»

Ehehehe!!!!

E olha que as «quentes e boas» todos entendiam. Talvez fossem ao engano .)

sem-nick disse...

O Variações cantava «É p'amanhã!»

Também dá...
:)

josé palmeiro disse...

Parece-me que há p'raí gravações dos pregões tradicionais, porque de outra forma, não os ouves mais.

Joaninha disse...

Olhem que estou a ver que outros é que me lembro e já me estão a escapar...
Havia os «morangos de Sintra!» por esta época. E obviamente o famoso «fava riiiica!» mas que já nem é bem do meu tempo.

De facto os cauteleiros ainda resistem, apesar dos tótos (bolas e lotos e milhões) que esses não usam pregões.
«Olhó totómilhõõõões!»
lol!

josé palmeiro disse...

"OLHÁ!!! LISBOA/CAPITAL/REPÚBLICA/POPULAR!!!"

Ou então assim:
"Olhai senhores,
esta Lisboa
de outras eras...
... e das touradas reais!
Das festas / das seculares procissões / dos populares pregões nacionais/
que não se esquecem mais."
Diriamos agora: "Que não se "ouvem", mais!!!

Mary disse...

Olá!
Também estive uns dias ausente...
E está bem apanhado esta coisa de os pregões serem «intraduzíveis»
O engraçado é que fiquei aqui a pensar e, apesar de ser uma coisa de que se fala tanto, também para já não me estou a lembrar de mais nenhum!

Mas de certeza que os havia!

André disse...

"nem se fala língua nenhuma..." dixit

Anónimo disse...

Ainda, nos finais dos anos 60, lembro-me de ouvir as vendedeiras de fruta:"Há figuinhos de capa rôta, quem quer figos, quem quer almoçar"e na praia: "Olh'ó gelado, há rajá fresquinho"(este último, dizem que ainda se houve).
Deixo-vos um poema sobre o tema,
boa noite.
Maria

“PREGÕES DE LISBOA”

Mal rompeu a madrugada,
Já Lisboa era acordada,
Com seus pregões matinais,
Pela varina peixeira ,
Lá p'rós lados da Ribeira,
Ou o ardina dos jornais.

A Rita da fava rica,
Que vem do bairro da Bica,
Traz pregões à sua moda.
E o homem das cautelas,
Diz p’las ruas e vielas,
Amanhã, é que anda a roda…

Apregoa-se a castanha,
Desde o Rossio ao Saldanha,
Os pregões são sempre assim,
Flores na Praça da Figueira
E diz cada vendedeira
Ó freguês!.. compre-me a mim!…

E de canastra à cabeça,
Quase até que anoiteça,
Há em mil bocas pregões.
Mas não se vê já passar,
A figura popular,
Da Rosinha dos limões!…

Autor: Euclides Cavaco