quinta-feira, março 05, 2009

Limites ao mau gosto

Há coisas que não passam pela cabeça de ninguém. Ou pelo menos nunca passariam pela minha...
A história é sinistra:

Um doente, numa urgência de Hospital, deitado numa maca foi coberto com um lençol onde estava escrito «Lá vai morto!»
Por aquilo que dizem os responsáveis e pelo que se vê da fotografia tirada pelos familiares antes de a coisa ser corrigida, o lençol teria sido mal lavado. A frase escrita a marcador teria sido escrita numa situação anterior e apesar de “os lençóis serem submetidos a lavagens com altas temperaturas, a tinta pode ter resistido e ao ser dobrado pode ter ficado virado para baixo e ninguém ter visto”.
Seja como for alguém a escreveu.
Alguém que trabalha no Hospital.
Alguém que não sentiu o mais leve respeito por um seu semelhante que acabara de morrer.

Nunca se vai saber quem foi, mas apesar de aceitar que quem lida diariamente com a morte tenha de recorrer a mecanismos de defesa para resistir ao peso da sua profissão, isto ultrapassa o aceitável.

Mais do que mau gosto, é estupidez e desumanidade.


Nota - Este post não leva nenhuma imagem a ilustrá-lo porque não encontrei nada suficiente forte para aquilo que senti.




6 comentários:

fj disse...

Mas aquilo pretenderia ser «uma gracinha»?!
É de tal forma estúpido que até custa acreditar.
Deviam estar bêbados!

Anónimo disse...

Eu não sou muito de rituais e «pompas fúnebres». Acompanho quem ficou triste com uma morte mas fico-me muito pelos vivos - e tento acompanhar os doentes enquanto são apenas doentes e podem apreciar a minha companhia.
Mas a verdade é que esta história é incrível, como dizes pela completa falta de respeito humano. Custa a acreditar de tão estúpida e brutal.

Anónimo disse...

Por acaso não fico tão chocada quanto isso.Claro que a familia do doente se achará ofendida e o doente não acharia graça à legenda.Mas acredito tb. que quem trabalha em areas de ligação entre terminais e "armazenamento" de cadaveres deve ver tanta coisa que se não tiver um distanciamento qualquer que pode passar por um humor mesmo negro não sei como se aguentará.AB

Anónimo disse...

Desta vez não concordo com a AB (alguma vez seria...)
:)

É a tal coisa dos «limites» como está no título do post. Concordo que tem de haver distanciamento. Sem isso, como dizes, é uma profissão que não se aguenta, tal como a de cangalheiro que deve ser um horror. E que entre eles digam as suas piadas, aligeirem as coisas, parece-me natural até. Os médicos numa sala de operações fartam-se de gozar, agora que há anestesias epidurais, o doente a ser operado ouve tudo e pode ficar a pensar que aquilo é muita galhofa para o momento...
Aqui, onde acho que se passou o limite, foi a coisa ter ficado escrita. Que o maqueiro a empurrar a maca dissesse ao outro «aqui vai morto!» como quem diz «aqui vai água» parece-me natural. que o escrevesse... isso não! É mesmo falta de respeito.

josé palmeiro disse...

Vamos lá ver se eu consigo dizer o que penso.
Li o post e retiro que o doente ou, o corpo se encontrava numa zona de viventes.
Li o comentário da Mary e concordo com ela, é em vida que devemos apoiar depois, bem depois é apoiar os que cá ficam, que bem necessitam. Depois li o comentário da AB e percebo o que ela quis dizer. Lembro-me, quando andava em Veterinária de visitar muitas vezes o Sta Maria em determinadas áreas e, não há dúvidas que o reppetir de actos e gestos em determinados contextos, nos dão uma certa duraza para os encarar. Tal, no entanto, não justifica, de forma alguma, o uso em zona, digamos ilícita, te um tal lençol com a referida inscrição. Há que ter discrição!

cereja disse...

Claro que o doente se encontrava numa «zona de viventes» amigo Zé. Estava num corredor de uma urgência, rodeado pela família e outros doentes. Por isso a família tirou a foto.
Nesta história acho que o King apanhou bem o que eu quis dizer. Era exactamente isso.
Na minha profissão também sou capaz de falar de «um caso muito interessante» se falo com colegas. Temos de ter alguma distância para a nossa saúde mental. Ali ultrapassou-se os limites!