terça-feira, abril 01, 2008

O Diário da Ana

Segunda-feira, dia 1 de Abril de 1974

É engraçado o mês começar a uma segunda, é um duplo início: da semana e do mês. Oxalá este mês nos corra melhor do que os últimos.

Hoje antes de sair fui deixar em cima da mesa da cozinha o dinheiro para a D. Lurdes porque na sexta-feira, que era fim do mês, esqueci-me de lhe deixar o ordenado e de certeza que lhe faz falta, coitada. Este meu ‘luxo’ da mulher-a-dias tantas vezes por semana sabe-me bem, apesar do conto e quinhentos que lhe pago nos fazer uma certa falta…Mas é um sossego para mim não chegar a casa esbaforida para fazer tudo, eu gosto do trabalho dela e ela também prefere a nossa casa, a outra patroa não lhe pagava o mês em que ia de férias. Eu acho que devo pagar, ela também tem de comer em Agosto, não é?

Assim como nós, eu ando a pôr de lado um pouquinho desde Janeiro para ver se em Agosto conseguimos alugar como o ano passado, aquela casinha de pescadores, lá na Fuseta. No ano passado foi muito bom, apesar do dinheiro ter sido mesmo à justa, é pena não se ganhar um pouco mais nas férias, assim uma espécie de subsídio de férias, isso é que era um sonho! Talvez um dia.

10 comentários:

Anónimo disse...

Deves ter apurado os dados mas olha que 1500 escudos para trabalho domestico em 74 não era ordenado era ordenadão.Um Encarregado de Biblioteca ganhava na CML,já com concurso feito,3.100 e uma renda de casa (limitada)custava 2.100 escudos.Na privada,um copiwriter publicitário ganhava 3.750 (mesmo um Ary antes de ser sócio da Espiral)e o O'Neil ganhava à peça.Na altura uma casa de 6 assoalhadas aqui na região da Luz,nova,custava 800 contos.AB

cereja disse...

A Ana no dia 8 vai pagar a renda e paga 1.110$00, que a casa dela é de renda limitada.
Mas ela aqui diz que é o seu luxo, a mulher-a-dias, porque vai lá a casa todos os dias. Pagava-lhe muito perto disso.
Creio que a Ana e o João, eram os dois licenciados e ganhariam cerca de 3 contos cada um. Claro que sem subsídios nem de almoço, nem de férias, nem de Natal.

Anónimo disse...

Esta «secção» promete!
(e com as achegas da nossa AB, melhor ainda)

Sou um pouquinho mais novo, nessa altura ainda não me ralava com rendas nem mulher-a-dias, mas com o preço dos livros, e bilhetes de eléctricos, e cinemas, e cafés...
Mas a inflação é um fenómeno impressionante. Nem é um zero a mais, são pelo menos dois zeros!!!

Anónimo disse...

Mas olha King, o mais importante aqui nem é (ou não é só) a impressionante diferença dos custos das coisas e dos salários, é a ausência do que podemos chamar apoios sociais que só surgiram depois - como aqui lembra a Emiéle, o subsídio de almoço, além dos meses extras de férias e Natal. E, a malta assalariada como a tal mulher a dias, se não trabalhava não ganhava, simplesmente. Férias? que é isso?

josé palmeiro disse...

Está tudo dito, nada mais tenho a acrescentar, resta-me confirmar em absoluto o que aqui se afirma. E, se alguém duvida, ainda tenho alguns recibos da época, para o confirmar.

Anónimo disse...

Resolveste muitíssimo bem a questão de não repetires os posts do 24 de Abril!
Esta forma é excelente. Para mim até é melhor, se não te ofendes, a outra era assim a modos que mais formal, tipo 'aula de sociologia', e assim é muito vivo.

Anónimo disse...

De qualquer modo comparar as «empregadas domésticas» de hoje com as mulheres a dias e criadas dessa altura, nem dá para comparar!!! Porque como aqui a Ana diz, elas não tinham férias nenhumas, quando as patroas faziam férias, elas iam lavar umas escadas, ou qualquer trabalho que arranjassem, porque a noção de férias não existia nessa classe. Era uma noção burguesa, e esta Ana é bem generosa em pensar em lhe pagar esse mês.

Anónimo disse...

Vocês fixaram-se no caso da empregada, mas aqui a «Ana» fala também deles próprios - ela e o marido, vão alugar uma casinha de pescadores no Algarve. Aqui está uma coisa que hoje não é já vulgar.
Mas nessa época ainda se estava a descobrir o Algarve, muitos de nós alugávamos casas por um preço acessível, só que o caminho até lá era uma canseira com tanta curva e estradas tão más...

Anónimo disse...

Este «Diário» promete!
Se todos os dias vem uma página destas, fico fã!
(e, bolas, deu-me umas saudades... vocês lembram-se da Fuseta, da ilha de Armona? nesses tempos, é claro, ela ainda lá está)

cereja disse...

:D
Gostei dessa de fazer saudades!
Bingo!! Era o que pretendia, uma visita ao passado...