quarta-feira, fevereiro 13, 2008

13 de Fevereiro

Parece que amanhã é Dia de S. Valentim.
É das tais datas «comerciais», completamente importadas, a que muita gente vai aderindo que isto do marketing é uma ciência muito importante e há quem o trabalhe bem.
Portanto desde há uns anos, esse passou a ser o Dia dos Namorados.
Contudo, para mim o dia importante é a véspera, hoje. Até porque o acontecimento que reporto foi numa época onde ainda não se tinha inventado este tal Dia de Namorados. Abril vinha longe, o fascismo enregelava-nos que nem sequer a tal ‘primavera marcelista’ se aproximava.
Faz hoje dois anos escrevi um post. Decidi transplantá-lo para aqui, para o novo blog, uma vez que se sou dona dos meus blogs, isto não será um plágio e sim uma … reedição.
Desta vez achei mais conveniente, uma vez que é uma história muito, muito antiga, catalogá-lo na categoria «Era uma vez…».
Cá vem:
«O esquecimento é um nevoeiro que vai invadindo tudo… Tal como o verdadeiro nevoeiro, têm pontos mais densos e outros mais ténues mas, contrariamente ao verdadeiro, não tem tendência a se dissipar. É curioso como se pode esquecer ou nem conhecer situações passadas há tão pouco tempo, espaço de pouco mais de uma geração.

Sei de um casamento que se realizou há 43 anos. Casamento por procuração, o que agora quase nunca deve acontecer porque raramente há uma necessidade tão urgente de se casar que não possa esperar que os dois noivos estejam presentes. Naquele caso o noivo não podia estar presente e era por isso que o casamento era muito urgente – e tudo se tratou em 10 dias.

Este noivo era um estudante. Empenhado em causas sociais, para além de estudar lutava por um mundo melhor e contra o governo de Salazar. Não sozinho, ele, a namorada e muitos, muitos companheiros.
Uma madrugada em fins de Janeiro, a polícia levou-o.
Adivinhava-se uns tempos muito sombrios, anos de cadeia, agravados pelas medidas de prevenção, sempre discricionárias. Quando ela o quis visitar na prisão a porta foi-lhe fechada na cara – só pais ou familiares próximos.

O caminho só podia ser um. Depressa, depressa, licenças, depressa, procurações, papeis, assinaturas, um rodopio.
Mas, a 13 de Fevereiro, à tarde, voltou a bater à porta da cadeia com a aliança que lhe brilhava no dedo desde manhã:
– “Estou aqui. Sou parente em primeiro grau. Venho ver o meu marido.”
Eles ainda se lembram bem, mas para a sociedade de hoje isto é apenas História.»


12 comentários:

fj disse...

fj

fj disse...

fj

Anónimo disse...

Eu sei que o post ( a parte em azul) é um link mas não consegui chegar lá, demorou demasiado a abrir. Não faz mal. A história é daquelas de deixar aqui uma coisa na garganta que a gente engole em seco e não vai para baixo.

Que dizer? Valeu a pena, com certeza. Se esses 'noivos' vierem aqui ao Pópulo, um abraço grande!

Anónimo disse...

Mary, demora a abrir porque a weblog mais uma vez (a 1000000000 vez!) está em baixo. Nenhum dos blogs dela está on line - já vi. E o link era para o Pópulo antigo que era de lá.

Mas eu recordo bem este post, que também me emocionou. Bem melhor que o S. Valentim!

Anónimo disse...

Lembro-me muitíssimo bem deste texto no «primeiro Pópulo»
Aliás era impossível esquecer, é muito tocante e bem escrito. Na altura considerei que te referias a familiares teus, e continuo a pensar o mesmo, mas para o caso isso nem importa.
Foram alguns casos destes que se passaram nesta altura e hoje temos tendência a esquecê-los. Claro que para quem este mais perto, a coisa deve mexer muito mais, imagino.

josé palmeiro disse...

Tão dramáticos eram esses tempos, que nos deixam, ainda hoje, com a lagriminha no olho. Tenho dois casos semelhantes, pela época e por tudo. Num o noivo estava, na Madeira a aguardar embarque para a guerra e não teve condições para assistir ao seu próprio casamento e outro que casou, nas férias curtíssimas que teve, entre a recruta e a especialidade, uma outra prisão, com destino anunciado.
São escritos assim que nos deixam, agarrados à vida, sem pensar nesses petróleos que se procuram, sem cessar e nos dias de um Valentim qualquer, a que, alguns, chamam santo.

Anónimo disse...

Conheço o caso que a Emiele refere.Soube das angústias dos factos e das gentes...era realmente uma époce dificil em que se criavam solidariedades imensas que comportavam perigos, mas também criavam crueldades imensas, na ortodoxia que parecia por vezes ser maior que o valor humano.Aos algozes fizeram-se maus julgamentos ou nulos...mas aos outros,também não perdoo.AB

cereja disse...

Pois é Zé Palmeiro e Ab, foram tempos pesados como chumbo, que os mais velhos não esquecem, e os mais novos não imaginam bem por não terem sentido na pele...
Joaninha e King, realmente repeti o post mas creio que não levaram a mal.
Mary, isso do link foi de facto culpa da malvada da weblog...

Anónimo disse...

Bom post, Emiéle.
Que importante é a nossa memória.

cereja disse...

Voltei aqui e vi que tinha dado uma palavra a todos menos aos primeiros comentários entrados, repetidos e tudo. É exactamente por não teres bem comentado, mas a verdade é que nestas histórias nem se sabe o que dizer... não é?
São memórias que ficam, como disse agora mesmo o RS.

Anónimo disse...

Aqui está outra que se lembrava do «original» mas que teve muito prazer em o voltar a ler.
Parabéns, se algum deles passar por aqui.

saltapocinhas disse...

também me lembro de ter lido esta história, presumo que de teus familiares próximos...
linda!

também para mim o dia dos namorados de amanhã não me diz nada.
o meu é mais daqui a uns dias!!