domingo, fevereiro 18, 2007

O Carnaval

Tal como as outras «datas obrigatórias» entendo que haja quem o rejeite. Quando falo em datas obrigatórias, penso no Natal, ou Passagem do Ano, ou Santos Populares, ou Páscoa, enfim dias onde é suposto todos terem as mesmas emoções. Claro que é impossível e artificial estar-se fraterno, ou animado, ou alegre, ou comovido, ou brincalhão, ou carinhoso, ou… num dia certo como se fôssemos um interruptor que se liga ou desliga. Concordo que não. Também penso que em qualquer destas situações como nos furacões ou torvelinhos do mar, se estamos mais perto do fenómeno (neste caso de pessoas que estão ‘apanhadas’ por esses sentimentos) teremos maior tendência a sentir parecido.
O Carnaval é um caso destes. Se, ou antes, quando somos crianças vivemos a época plenamente e com toda a alegria. Depois vai-se crescendo e tudo começa a depender do nosso feitio por um lado, do local onde vivemos e dos amigos com quem nos damos mais, por outro.
Há uns séculos atrás, onde a vida social e os costumes eram muito mais rígidos, mais formais, havia normas muito sérias quanto à forma como nos vestíamos, o que dizíamos, que comportamentos tínhamos – os dias de Carnaval eram importantes como um escape para se fugir durante eles aos comportamentos a que se tinha de obedecer durante todo o ano. Ainda por cima este tempo vinha imediatamente antes de um outro muito grave e pesado que era a Quaresma, onde os cristãos faziam penitências e acabava toda a brincadeira.
Neste milénio as coisas estão bem diferentes nessa ‘perspectiva sociológica’, chamemos-lhe assim. Há muito menos recalques durante o dia-a-dia portanto menos necessidade destes períodos de time out. E em Portugal deu-se um fenómeno de imitação completamente artificial que foi a cópia infeliz do modelo brasileiro. O Carnaval brasileiro é um fenómeno único e é deles! Não pode ser exportado e a sua imitação acaba por ter um ar (desculpem o termo mas não me ocorre outro) pindérico! Não há nem pode haver desfiles de escolas de samba, porque não há samba, nem há escolas, nem há nada disso na nossa tradição! E as organizações dos diferentes Carnavais que pretendem essas imitações manhosas estão claramente condenadas ao fracasso.
Mas há também em Portugal tradições de terras onde se vive o Carnaval de um modo muito autêntico e bem disposto. Pelo que sei, lá
nas terras do amigo Farpas a coisa é famosa. E uma amiga que vive em Torres esteve no outro dia a contar-me que para além do «corso» e essas actividades mais mediáticas e vistosas, eles lá vivem o Carnaval a noite toda e levam isso muito a sério. Grupos de amigos mascaram-se de igual, de africanos, de extraterrestres, de esquimós, de palhaços – as lojas vendem metros e metros de tecidos e eles fazem as suas fantasias em casa divertidíssimos e tentando mostrar a sua imaginação.
Bem, eu que não sou torriense, nem canense, sou uma pobre e simples lisboeta, sei que não vou ter nenhum «assalto» na minha casa e o Carnaval que recordo é o da minha infância.
E que bom que ele era! Como me sentia contente vestida de espanhola, ou dama antiga, ou bailarina, ou fada. Vestidos feitos em casa, um pouco trapalhões mas criados com tanto amor por quem o costurava que me sentia felicíssima. Só era pena acabar na 3ª feira apesar de ainda poder brincar com os meus amigos sempre que me apetecesse até o vestido se desfazer.
Tempos que já lá vão…

6 comentários:

Anónimo disse...

Antes de mais, os meus agradecimentos, pela forma como me tratas.
Venho aqui, exactamente por isso, porque me identifico, e nós, quando nos identificamos, estamos bem.
Ora hoje escreves sobre o carnaval, e não posso estar mais de acordo com o que dizes, é mesmo o que eu sinto. Nós cá em casa, também fazíamos os fatos para a nossa filha, e era um gosto, de atl forma que ainda guardamos alguns, para a nossa neta.
Quanto ao abrasileiramento do carnaval, seio bem, pois por aqui, em Loulé, é ponto de honra, coisa com que eu discordo, pois perdeu-se a expontaneedade, tão caracteristica, das gentes algarvias.
Vivamo-lo o melhor que nos for possível.

cereja disse...

Zé - É esta uma mas maravilhas da net, virmos a encontra pessoas distantes e tão próximas! Muito do que digo faz eco em ti (coisa extremamente agradável para quem escreve) porque realmente sentimos muito parecido... Já deu para ver que nenhum de nós é 'conservador'. mas a verdade é que a vida passa, há memórias que são belas de conservar. Esse Carnaval da nossa infância, «artesanal», com fatos feitos pels nossas mães, e os dos nossos filhos que seguiram esse modelo, são boas memórias, quentes, ternas, generosas, alegres. As 'partidas' eram inocentes. Ainda ontem estive a lembrar que quando faziam asssaltos lá em casa, os 'assaltantes' traziam comidas é claro, mas lá em casa fazia-se também qualquer coisa a sério e algumas de partida:
Uns rissois com recheio de algodão por exemplo - quem dava uma dentada ficava com a boca cheia de algodão!!! Um tacho de barro virado ao contrário e coberto de glacé - quando se pegava na faca para partir uma fatia, apanhava-se a surpresa da faca não entrar! e por aí fóra... Era Carnaval, era brincadeira...

saltapocinhas disse...

Conheço o carnaval do farpas e lá é giro, a rivalidade entre o Paço e o rossio! e é genuino, nada de brasileirices.
Ainda há por aí carnavais genuinos, mas não sei bem onde pois é festa que não aprecio.

cereja disse...

Sabes Saltapocinhas, hoje e então aqui em Lisboa, também para mim é uma festa de crianças e um feriado que é agradável. Mas relembro um tempo mais antigo de adolescência e jovem adulta onde me divertia mesmo bastante. Num estilo familiar como disse ali em cima, mas agradável.

Farpas disse...

É assim mesmo Emiéle, aqui o Carnaval é português, entre o Paço e o rossio (nota: Paço com letra grande rossio com letra pequena de forma propositada :D) existe uma rivalidade de 401 anos, e nunca acabará!

cereja disse...

Quatrocentos anos????
Ai, Farpas que isso até assusta! E ainda a gente fala do Sporting e Benfica...
Mas como reparaste, eu por um lado até aprecio o carnaval quando é desse tipo, e referi o «teu» por estar assim mais 'à mão' porque não conheço bem os outros. e ainda bem que foi tão bem disposto como as tuas fotos mostram.