Tempos diferentes
Estava ontem a ler uma história traduzida do inglês (e o quê nem interessa porque isso acontece quer num romance de qualidade quer num inocente policial) e, mais uma vez encontrei duas personagens que a brincar trocaram citações de Shaskespeare.
Sabemos como isso acontece constantemente, em romance anglo-saxónicos. Por vezes vão mais longe, citam outros poetas, outros escritores, mas o tal «famoso bardo», desse, estamos a ouvir constantemente citações que são de imediato risonhamente identificadas. É certo que todos dizem que andamos a ler muito menos e, portanto, é talvez natural que ocorram por cá com menos frequência e naturalidade, citações idênticas. Mesmo o Eça que ainda há poucos anos era ainda bastante citado, por algumas das suas célebres frases trocistas ou muito definidoras de certo tipo de mentalidade, cada vez se citar ouve menos. Para não falar de outros escritores ‘menores’. Lembro-me muito bem de ouvir na minha família a frase «Toma arsénico, João!» quando se falava de uma teimosia, o que será hoje, muito provavelmente, uma frase sem o menor significado. Tenho uma amiga chamada Leonor que já fazia um sorriso amarelo quando era apresentada a alguém porque logo lhe perguntavam se ‘ia para a fonte, pela verdura’…? mas as pequenas Leonores de hoje não costumam ouvir essa pergunta e talvez nem entendessem a gracinha.
É que a cultura é outra.
Hoje entremeamos na conversa – e falo por mim própria! – slogans publicitários, quando são mais conseguidos, ou frases de humoristas. O Herman José deu-nos bastantes, - ainda falamos como o Diácono Remédios ou o Tony Silva - os Gatos Fedorentos deram-nos outras.
Com toda a sinceridade, acreditem que isto não é uma censura. Se as frases têm graça, se encaixam no que queremos dizer, porque não usá-las…?
Mas é pena que não haja lugar para tudo. Para as graças dos dias de hoje, e para as citações literárias. É que não ‘havia nexessidade’ de esquecer que o Conde de Abranhos ou o Conselheiro Acácio, ainda são carapuças que se podem enfiar em muitas cabeças. E o arsénico que o Daniel receitava ao João da Esquina, pai da casadoira Francisquinha, não será muito diferente de um medicamento experimental... a vida não muda assim tanto, a nossa cultura é que é outra.
Sabemos como isso acontece constantemente, em romance anglo-saxónicos. Por vezes vão mais longe, citam outros poetas, outros escritores, mas o tal «famoso bardo», desse, estamos a ouvir constantemente citações que são de imediato risonhamente identificadas. É certo que todos dizem que andamos a ler muito menos e, portanto, é talvez natural que ocorram por cá com menos frequência e naturalidade, citações idênticas. Mesmo o Eça que ainda há poucos anos era ainda bastante citado, por algumas das suas célebres frases trocistas ou muito definidoras de certo tipo de mentalidade, cada vez se citar ouve menos. Para não falar de outros escritores ‘menores’. Lembro-me muito bem de ouvir na minha família a frase «Toma arsénico, João!» quando se falava de uma teimosia, o que será hoje, muito provavelmente, uma frase sem o menor significado. Tenho uma amiga chamada Leonor que já fazia um sorriso amarelo quando era apresentada a alguém porque logo lhe perguntavam se ‘ia para a fonte, pela verdura’…? mas as pequenas Leonores de hoje não costumam ouvir essa pergunta e talvez nem entendessem a gracinha.
É que a cultura é outra.
Hoje entremeamos na conversa – e falo por mim própria! – slogans publicitários, quando são mais conseguidos, ou frases de humoristas. O Herman José deu-nos bastantes, - ainda falamos como o Diácono Remédios ou o Tony Silva - os Gatos Fedorentos deram-nos outras.
Com toda a sinceridade, acreditem que isto não é uma censura. Se as frases têm graça, se encaixam no que queremos dizer, porque não usá-las…?
Mas é pena que não haja lugar para tudo. Para as graças dos dias de hoje, e para as citações literárias. É que não ‘havia nexessidade’ de esquecer que o Conde de Abranhos ou o Conselheiro Acácio, ainda são carapuças que se podem enfiar em muitas cabeças. E o arsénico que o Daniel receitava ao João da Esquina, pai da casadoira Francisquinha, não será muito diferente de um medicamento experimental... a vida não muda assim tanto, a nossa cultura é que é outra.
10 comentários:
Tem piada essa do 'inocente' romance policial. Hoje em dia que ligamos a tv e a vida aqui em Portugal parece a cópia de uma série. :) Assaltos, refens, coisas nunca vistas. Inocente?....
Passando ao que dizes, de facto as citações mudaram. Mas olha que 'citar' anúncios como paródia sempre me lembro de se fazer.
«Oh Isabel, olha o relógio!...» lembram-se?....
Lembro sim senhor!!!!!
Ela ia mergulhar na piscina, mas levava o relógio. Só que já nem me lembro se era à prova de água e seria esse o interesse da recomendação!
Mas aqui o que gostava de sublinhar era exactamente que sendo natural 'citarem-se' outras fontes, desapareceram muitas das citações lietrárias. Acho eu, mas posso estar enganada!
Emiéle, não sei se isso (que até é verdade) não tem a ver com o grupo social ou cultural de que estás a falar. Creio que em certos meios ainda se cita muito, e não só o Eça, há muitos poetas que estão na nossa cabeça.
Oportuno escrito.
Sinais dos tempos em que o que se diz e fica, por uns tempos, não tem a eternidade de antanho.
Deixo-te/vos, um extrato do Eça, no seu/nosso, "Crime do Padre Amaro"
"... — Vejam — ia dizendo o conde:— zvejam toda esta paz, esta prosperidade, este contentamento... Meus senhores, não admira realmente que sejamos a inveja da Europa!
E o homem de estado, os dois homens de religião, todos os três em linha, junto às grades do monumento, gozavam de cabeça alta esta certeza gloriosa da grandeza do seu país, — ali ao pé daquele pedestral, sob o frio olhar de bronze do velho poeta, erecto e nobre, com os seus largos ombros da cavaleiro forte, a Epopeia sobre o coração, a espada firme, cercado deos cronistas e dos poetas heróicos da antiga pátria — pátria para sempre passada, memória quase perdida!"
Bom,primeiro lembro que, tu própria, em determinada altura, qd. eu comecei a comentar, não sei se ainda no Afixe, me chamaste a atenção para aquilo que classificaste de "texto culto" e sublinhaste algumas das citações literárias que eu uso e, confesso. às vezes abuso, mas olha, cada um é como cada qual.
Depois dizer "toma arsénico João" não é a mesma coisa que dizer "ser ou não ser",isto partindo só da universalidade da coisa, e imaginando que, hoje em dia, se sabe o que é arsénico, ou que, com a proliferação da "INOCENCIA"de que falas,alguém jovem tem algum interesse na ruralidade do Sr.Dinis.Quanto aos "slogans" ou "Gags" se são bons são mesmo para isso-para entrarem na linguagem corrente e substituirem de uma penada conceitos com mais palavras...Mas percebo o que queres dizer.AB
Já agora volto com essa dicotomia Qualidade/inocencia...sobretudo quando se trata de policiais, que as pessoas tem a mania de classificar de género menor.Como em tudo há maiores e menores.E a inocencia versus qualidade deixa-me seriamente a pensar.( a pensar no significado atribuido às palavras).AB
Lá o «ser ou não ser» ou «uma rosa com outro nome...» etc, são citações que já são mesmo universais, mas concordo com a Emiéle que na literatura de língua inglesa se cita por exemplo o Sheaspeare de uma forma constante, e citações dos Hentiques todos, do Otelo, do Macbeth, eu sei lá, e rapidamente a pessoa da conversa dá a resposta certa. Claro que sendo teatro há 'resposta a dar', e nos casos nossos escritores nem sempre a coisa dá para resposta.
comigo era "margarida vais à fonte?"
(confesso que não sei a autoria desta frase, só a conheço como letra de uma cantiga)
e imagina o mais engraçado: a minha melhor amiga chama-se Clara (continuamos amigas e até somos comadres a duplicar). Não me movimentava num meio onde as pessoas liam muito, mas lembro-me de me escandalizar quando alguém nos dizia que éramos "pupilas"!!
nós pensavamos sempre que era uma asneira e íamos a cochichar o resto do caminho!!
Bom-dia, Saltapocinhas!
Realmente uma Clara e uma Margarida provoca ideias... :)))
Quanto ao facto da Margarida ir a fonte...? A Leonor tinha duas citaçoes literarias diferentes, mas nao vejo a Margarida... (que raio, os acentos fugiram agora aqui deste teclado!!!)
AB, claro que na nossa epoca se usavam citaçoes, tu tens uma invejavel memoria como eu sei, e para alem disso o nosso ensino era muito memorizado. A gente decorava imensas poesisas por exemplo que ainda hoje sou capaz de repetir. Se te disse isso quando comentavas no Afixe (eu nem me lembro...) devia ser para explicar porque e que por vezes nao serias bem entendida...
Ze Palmeiro, eu nem ia tao longe. Nao estava a pensar numa citaçao assim tao extensa, mas a verdade e que muitos de nos sabemos de cor frases que vem a proposito. E acho piada que hoje sao exclusivamente os tais slogans (os bem conseguidos) da publicidade.
Emiéle, eu entendi perfeitamente a ideia das citações que tu quiseste aclarar, mas encontrei aquela, apesarde extensa e fora de contexto, mas, tão actual, que me apeteceu partilhá-la com todos voçês.
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