Quando ser patrão é difícil
Estive ontem em conversa com uma grande amiga minha, e confrontámos o mesmo sentimento perante uma situação melindrosa:
Temos as duas ‘valores de esquerda’, sem dúvida. Apoiamos quem trabalha e tentamos ver a vida pelo ângulo de quem tem menos e «vende» o que sabe fazer de modo a ganhar o seu sustento - os trabalhadores por conta de outrem.
Mas acontece que, as duas, também somos ‘patroas’, afinal. Temos mulheres-a-dias (ou empregadas domésticas como se diz agora) e, no caso dela que tem uma profissão liberal, uma empregada-recepcionista – nesse caso quem está a «comprar o trabalho» somos nós, passamos para o outro lado da barricada. E lidamos bastante mal com isso.
Quanto às ditas mulheres-a-dias, temos claramente a noção de que o jogo está viciado, no nosso caso. O trabalho é mal feito, muitas vezes não aceitam o que se lhes diz, ‘viciam’ as horas que prestam, e depois nós as duas «temos vergonha» de lhes chamar a atenção. Erro, é claro. Há outras amigas que nos chamam parvas, mas é difícil mudar de feitio…
Mas ontem, a minha amiga estava ainda mais aflita porque agora o problema era com a sua empregada do consultório. É uma pessoa de grande confiança, trabalha lá há imensos anos e é quase uma amiga, o que ainda dificulta mais a questão. Mas, quer ela quer os seus colegas, iam ter uma conversa desagradável com a D. Luísa porque ela tem vindo a reduzir unilateralmente o seu horário de um modo escandaloso…
Quando lá está é impecável: atenciosa, prestável, delicada, tentando resolver todas as dificuldades, os clientes gostam bastante dela. Simplesmente, desde há uns tempos para cá que anda a chegar cada vez mais tarde e a sair cada vez mais cedo… É certo que como aquilo é um consultório, eles só lá vão quando têm clientes marcados. Como a crise é geral, até pode haver tardes onde apenas tenham dois clientes e portanto só lá estão essas duas horas, mas o contrato da recepcionista diz que ela tem de lá estar, até para atender o telefone…!
E é isso que não se passa, a minha amiga e os colegas estão a ver que a «sua recepcionista» chega um pouco antes deles ao consultório e põe-se a andar assim que saem eles e o cliente. Se houver um dia sem marcações nem lá vai... Isto não pode ser, até porque perdem trabalho com isto, há quem tente muitas vezes ligar para lá para marcar consulta mas, como ninguém atende, às tantas desiste e procura outro lado!
Ora esta desagradável conversa que se impõe estava a moer a minha amiga de tal modo que ela nem falava noutra coisa. Esse ralhete ia ter de ser à tarde, mas de manhã ela estava com dores de barriga…
É difícil ser patrão, às vezes, oh se é!
Temos as duas ‘valores de esquerda’, sem dúvida. Apoiamos quem trabalha e tentamos ver a vida pelo ângulo de quem tem menos e «vende» o que sabe fazer de modo a ganhar o seu sustento - os trabalhadores por conta de outrem.
Mas acontece que, as duas, também somos ‘patroas’, afinal. Temos mulheres-a-dias (ou empregadas domésticas como se diz agora) e, no caso dela que tem uma profissão liberal, uma empregada-recepcionista – nesse caso quem está a «comprar o trabalho» somos nós, passamos para o outro lado da barricada. E lidamos bastante mal com isso.
Quanto às ditas mulheres-a-dias, temos claramente a noção de que o jogo está viciado, no nosso caso. O trabalho é mal feito, muitas vezes não aceitam o que se lhes diz, ‘viciam’ as horas que prestam, e depois nós as duas «temos vergonha» de lhes chamar a atenção. Erro, é claro. Há outras amigas que nos chamam parvas, mas é difícil mudar de feitio…
Mas ontem, a minha amiga estava ainda mais aflita porque agora o problema era com a sua empregada do consultório. É uma pessoa de grande confiança, trabalha lá há imensos anos e é quase uma amiga, o que ainda dificulta mais a questão. Mas, quer ela quer os seus colegas, iam ter uma conversa desagradável com a D. Luísa porque ela tem vindo a reduzir unilateralmente o seu horário de um modo escandaloso…
Quando lá está é impecável: atenciosa, prestável, delicada, tentando resolver todas as dificuldades, os clientes gostam bastante dela. Simplesmente, desde há uns tempos para cá que anda a chegar cada vez mais tarde e a sair cada vez mais cedo… É certo que como aquilo é um consultório, eles só lá vão quando têm clientes marcados. Como a crise é geral, até pode haver tardes onde apenas tenham dois clientes e portanto só lá estão essas duas horas, mas o contrato da recepcionista diz que ela tem de lá estar, até para atender o telefone…!
E é isso que não se passa, a minha amiga e os colegas estão a ver que a «sua recepcionista» chega um pouco antes deles ao consultório e põe-se a andar assim que saem eles e o cliente. Se houver um dia sem marcações nem lá vai... Isto não pode ser, até porque perdem trabalho com isto, há quem tente muitas vezes ligar para lá para marcar consulta mas, como ninguém atende, às tantas desiste e procura outro lado!
Ora esta desagradável conversa que se impõe estava a moer a minha amiga de tal modo que ela nem falava noutra coisa. Esse ralhete ia ter de ser à tarde, mas de manhã ela estava com dores de barriga…
É difícil ser patrão, às vezes, oh se é!
10 comentários:
Este é um post que podias encaixar na categoria intimidade ou como é que lhe chamas.
Não é coisa que não tenha pensado.
Quando sentimos em nós algumas coisas começamos a ver os factos com luz diferente. Já me aconteceu, em questões de serviço, darem-me determinadas funções, e de repente, começo a ver as coisas de outra forma. Colegas que se baldavam e eu achava graça, ou até os apoiava, de repente começo a ver que não tem graça nenhuma e prejudicam o trabalho dos outros.
Esse exemplo, do pequeníssimo patronato que somos nós com com as nossas mulheres-a-dias, é muito justo. Eu também me custa imenso chamar a atenção quando as coisas estão mal, e ainda por cima porque muitas vezes a resposta é desabrida e negando frontalmente aquilo que digo e... posso provar! Muitas vezes é uma errada consciência de classe.
Quem se lembra da rábula notável da Ivone Silva chamada "Olivia empregada-Olivia patroa"?Está lá tudo!AB
Diz o poema de O'Neill:
"Prefilados de medo, agradedeçemos
o medo qur nos salva da loucura.
Decisão e coragem valem menos
e a vida sem viver é mais segura...."
Temos dificuldades em assumir as coisas, por isso a dificuldade em exigir dos outros, aquilo que outros, de nós exige. Depois, o trabalho doméstico, não é assumido convenientemente, com descontos, para a segurança social, etc.. É mais fácil dar o dinheiro a quem nos presta, não um serviço, mas um favor. Por outro lado, temos uma dificuldade imensa em lidar com as amizades, o medo de ofender e por aí fora, sem nos lembrar-mos que para nós, basta o chefe não ir com a nossa cara, para a água transbordar do copo. Connosco é sempre um problema, chamar a atenção de quem para nós trabalha e não cumpre. É mesmo um mal congénito, que temos que alterar. Conto-vos um caso que se passou com um filho meu. Fez um trabalho, que, com todas as indicações, mandou executar numa tipografia. Fui buscar o trabalho com ele e, quando chegámos ele abriu as caixas e constatou que o serviço não estava exactamente como ele o tinha solicitado. Com uma calma extraordinária, mandou tudo para trás e disse que assim não por isto e por aquilo e que exigia o trabalho, conforme ele tinha contratado no prazo X. Calculem como eu fiquei. Aquilo passava menos mal, aos olhos de um incauto e se fosse eu certamente passava, mais que não fosse para não me aborrecer. Com ele, não!
Se, no momento me pareceu um exagero, depois, quando vi o trabalho. tal qual tinha sido projectado, compreendi a diferença.
Enfim, problema de gerações, que nós temos que ultrapassar pois estamos a fazer mal.
Bem lembrado, AB. Saber mandar é realmente, muito difícil.
Ora bom dia!
Passei por cá para ver os resultados da «sementeira» da manhã...
Por acaso já sei do resultado da famosa conversa, e como se previa não foi famoso. A senhora a quem foi chamado a atenção reagiu pessimamente, chorou, disse que se era assim que a despedissem, que não era verdade, podia chegar uns minutos mais tarde mas cumpria o horário, que muitas vezes durante toda a tarde nem tocava o telefone, etc. Lá lhe responderam que ela só sabia que «não tocava o telefone» nas tardes onde estava lá, não podia garantir que naquelas onde não estava ele também não tocasse...
Enfim, espera-se que o pó assente, e as coisas voltem a encarrilar.
Zé, não sei se tem a ver com gerações diferentes ou com feitios diferentes. Há quem (e falo por mim) tenha dificuldade em assumir a autoridade. Talvez a psicanálise explique... Quanto ao trabalho doméstico, muitas vezes não é assumido nas suas vertentes de segurança social etc e tal por pedido expresso das próprias empregadas. Muitas recebem outros subsídios, ou não querem elas descontar, ou... De um modo geral, quem lhes paga gosta de ter tudo em ordem, porque pode ser penalizado se for apanhado em falta. Mas é uma área onde as duas Olívias se confundem um tanto!
Este tema dá cá pano para mangas... A verdade é que custa por em causa o trabalho alheio. Entendo muito bem o Palmeiro, com a história que contou do seu filho. Eu tenho a certeza de que tinha ficado encavacado, achando que se estava 'mais-ou-menos" já servia. É um acanhamento especial. No caso que contas, por um lado entendo que se tivesse de dizer alguma coisa à senhora, se de facto ela aldrabava tanto o horário combinado, mas era difícil desmenti-la se, como dizes, ela negava que o fizesse...
Eu ficava à rasca, confesso.
Não tenho nenhum jeito para patrão.
Sinto-me na onda d joaninha e jp. Como forma de superar só vejo ormação intensiva em psicanálise( que se acautelem os nossos pais )se possivel de uma perspectiva marxistacom enfase na "correcta perspectiva de clase, destinados aos que têm uma classe mais meia. Deve ser facil e barato, e nalgumas gerações deve estar a resultar, como dizia um professor meu defendendo a "elevada capilaridade social na idade média".
Gostei da imagem do balão com os corações a ficar demasiado cheio... É que às tantas, a paciência e a tolerância (os corações, não é?) rebentam, chegam ao limite.
Quem é que não passou por situações destas??? Ter de dizer uma coisa desagradável, que seria escusado se o outro fosse cumpridor respeitasse o seu próprio trabalho.
Eu também detesto, mas ainda é pior ficar engasgada e começar a tomar o outro de ponta. Porque é o que acontece, quando não dizemos aquilo que achamos justo, depois tudo o que o outro faz já nos dá para embirrar. É bem mais justo, dizer a crítica no momento certo e desanuviar os ares.
Eheheheheh!!
Este FJ!!
A "elevada capilaridade social na idade média". :))))
Quem era?
Cheira-me a Direito.
situações complicadas!
eu tenho apenas uma mulher a dias 1 tarde por semana e detesto ser "patroa"
aliás,não tenho mesmo jeitinho nenhum e por isso ela faz o que quer...
a tua amiga tinha mesmo de falar: cumprir o horario é o minimo dos minimos!
É essa a questão, Saltapocinhas, gente sente que «não tem jeitinho nenhum», atrapalhamo-nos e ...«ela faz o que quer» e não o que nós queremos.
Mas é justo?
No caso em questão a dificuldade era a relação de certa amizade já criada, mas que afinal funciona só num sentido. A minha amiga até lhe disse nessa conversa difícil que ela levasse um livro para ler, um tricot, mas... tinha de atender o telefone! Parece tão simples.
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