quinta-feira, fevereiro 14, 2008

Dois pesos, duas medidas

Há milhares de situações de desequilíbrio social a que já estamos tão acostumados que se passa por eles sem se dar conta. Aceitamos, com uma visão pessimista mas o certo é que se aceita como «sendo assim».
De vez em quando aparecem contudo casos onde se torna impossível esse desviar de olhos. São demasiado gritantes.
Ando há uns dias a remoer a comparação entre duas histórias com imenso em comum, mas separadas pelo enorme fosso da posição social – os casos da Madie e da Joana.
Passaram-se os dois no Algarve. Foram duas crianças que desapareceram. As famílias só foram à polícia algum tempo depois. Nunca aparecerem, nem vivas nem mortas. As pistas não levaram a nada.
Mas no caso da menina inglesa, a sua família tinha grandes conhecimentos e pertencia à elite, e a menina portuguesa era duma família no fundo da escala social. Nas duas situações a comunicação social tomou partido, falou, influenciou a opinião pública. E, a verdade é que, enquanto o casal McCann voltou para a sua terra sem ser molestado e o mistério parece ficar por esclarecer, a família da Joana foi submetida a pesadíssimos interrogatórios, e apesar de as ‘provas’ não serem muito diferentes das ‘provas’ do caso da Madie, a mãe foi a julgamento e foi condenada.
Baseada a sentença, pelo que sei, em confissão. Mas confissão obtida como?
Esta Leonor Cipriano, tal como a Kate McCain, era uma mulher que mostrava poucas emoções o que não agrada aos media, e além disso era pouco bonita, era rude, não sabia falar, quase parecia um pouco atrasada. O oposto da outra senhora. Queixou-se de maus-tratos, mas que era isso? Se já estava decidido que era uma assassina todos os maus-tratos se justificavam. Se tinha a cara com nódoas negras foi porque caiu pela escada abaixo (e como é que caiu?...) e até se compara - imagine-se! - com o acidente da princesa Diana.
Deve ser o único ponto coincidente destes dois seres – pertencerem ao género feminino e terem lesões na cara que, de resto, o mundo inteiro as separa.

Assim como também o mundo inteiro separa estes dois casos, tão semelhantes e tão diferentes pelo meio social onde se passaram.


6 comentários:

Anónimo disse...

Tenho de voltar cá mais tarde, que este assunto implica mais tempo para escrever e estou com muito pouco.
De qualquer modo, a responsabilidade dos media, neste formar da opinião pública é tremenda!

Anónimo disse...

Idem.AB

Anónimo disse...

Esse caso da Joana sempre receei que se tratasse de um tremendo erro judicial.
Se um dia a menina aparece, como se vai indemnizar as pessoas que foram presas com base em confissões arrancadas?

Anónimo disse...

Este post dá matéria a muita reflexão e eu, fazendo «minhas as palavras dos oradores antecedentes» não tenho agora tempo para isso.
No essencial tens toda a razão. A diferença social é gritante, e os casos são muitíssimo parecidos. E também fiquei parvo com a comparação com a princesa Diana!!!!

josé palmeiro disse...

Não é nada que todos nós, não tenhamos já pensado, mas para dentro, tu tiveste a coragem de o pôr cá fora, à discussão. Não restam quaisquer dúvidas, sobre a diferença de tratamento dos arguidos, face à condição social que apresentavam, demonstrado à saciedade a diferença entre o Bem e o Mal, só que, pergunta-se, onde está o Bem e o Mal?
Será a condição social condição para a detecção da culpa ou da não culpa?
Histórias, mal contadas, protogonizadas por um aparelho judicial, velho e caduco, assente em regras e estereótipos, gastos.
Nós, o POVO, gostaríamos de saber!
Será que o Poder, terá poder para o dar a conhecer? Não acredito, pois pelo caminho que a justiça anda, vidé o "apito dourado", não me parece que se faça luz. Aquilo é tudo "peixe graúdo".

Anónimo disse...

Esta é de facto uma comparação que salta aos olhos. Contudo vamos pensando (e dizendo) mas tenho visto pouca gente a 'escreve-lo' como disse ali o Zé.
Por um lado o papel dos media e dos tabloides nestas histórias todas. No caso da Joana se aquilo fosse um julgamento com júri, não deviam conseguir gente suficiente, porque todos tinham já uma opinião preconcebida. No caso da Madie foram mesmo os pais que 'trabalharam' nesse sentido, mas para os media foi um maná! Esse é um ponto que devia ser muito mais controlada, o «fazer» da opinião pública usando as técnicas mais rasteiras.
Depois esse casal McCain, também é um tanto estranho. A verdade é que a sua origem social também não é exactamente a nobreza, mas o certo é que se dão com a elite, mercê de que conhecimentos, não se compreende. Tudo isso é sombrio e estranho.
Mas o que mais impressão faz é mesmo o caso da mãe da Joana, que sem dúvida foi coagida a confessar, e com que métodos não se sabe, e foi condenada! Não sei se a mulher tem ou não culpa, o que sei é que aquilo que dizem não me satisfaz, e não deixa os métodos policiais nada bem vistos.