sábado, janeiro 05, 2008

Comunicação

Ontem, nos comentários ao meu post brincalhão sobre os casamentos, falou-se de casamentos curtos e outros prolongados. E veio-me à memória um desenho que já em tempos tinha usado para ilustrar não sei bem o quê.



Este desenho vinha num site de humor e portanto pretendia ser engraçado.
Aos meus olhos é tristíssimo.
Retrata algo que tanto pode ser um marido que deixou o jornal como biombo e desapareceu por estar farto da mulher, ou uma mulher que ergueu aquele jornal para fantasiar que atrás dele está um companheiro. De qualquer das formas é sempre bem amargo e, para mim, a imagem da maior das solidões.
E o certo é que muitas ligações se vão perdendo por cansaço, rotina, intolerância, e sobretudo por ausência de comunicação.
Li, muito recentemente um 'técnico em relações' que contava que o apocalipse da comunicação tem 4 cavaleiros: A Crítica, o Desprezo, o Contra-Ataque e o Recuo Total.

A primeira ataca quando em vez de uma queixa se atira com uma crítica. Ao fazer-se uma queixa, apresenta-se um facto, mostra-se como ele nos afectou a nós e permite uma análise da questão; na crítica, avança-se de imediato com um juízo de valor sobre esse acto, e o carácter de quem o pratica, fechando a porta à comunicação.

O segundo, pode aparecer com a forma de insultos verbais – «que disparate!», «nem sabes o que dizes» - ou por mímica, como fechar o olhos abanando a cabeça, levantar os olhos ao tecto, boca fechada com os cantos descaídos. Quem apanha com essa reacção do seu parceiro, também não vai conseguir estabelecer uma ponte de comunicação.

O terceiro, o Ataque, é a faceta mais visível de uma má relação. Os gritos, berros, a agressão mesmo sem ser ameaça física, estão desde logo a impedir que haja uma conversa, uma troca de pontos de vista. É quase sempre uma escalada, onde cada qual grita mais e ninguém ouve nada.

E o quarto, que parece mais manso e é talvez o mais grave: esse Recuo é a desintegração da relação, a qualquer tentativa de aproximação há um silêncio, o olhar para a TV ou para o jornal, é ‘negar’ a existência do outro. A pazada de terra final.

É esse «último cavaleiro» que a imagem mostra.
Quando o silêncio preenche todo o espaço e deixa de haver relação. Pior que a raiva, que a zanga, é essa fria indiferença.


13 comentários:

Anónimo disse...

Uff....
Emiéle, minha cara, vou ali tomar um cafézinho, e já volto a comentar.
É que isto é muita areia para se assimilar a um sábado de manhã...

Anónimo disse...

Enquanto o King foi tomar café, venho eu, que também fiquei a pensar (e até para 'espairecer' fui rir um pouco no post de cima)
Quem não conhece essas cenas?
O tal jornal como biombo, é terrivelmente agressivo, como também podem ser as agulhas de tricot, noutro estereotipo. Como chamas a atenção para o teu post sobre casamento, é aí que nos vamos situar. A verdade é que os casamentos há cem anos, mantinham-se como tal, muitas vezes por ausência de alternativas, mas eram duas pessoas que coabitavam, mas não viviam juntas. Viver é outra coisa, não é morar na mesma casa.
Contudo, também sinto que muitas vezes hoje se vive segundo o «princípio do prazer imediato» e caimos no outro extremo, onde não há cedências, não há tolerância, não há tempo para reflexão.
Estes 4 princípios são pesados!
Quanto a mim, o que está subjacente é a falta de respeito pelo outro. A tal norma de «não faças ao outro o que não queres que te façam a ti» parece muito dificil de ser cumprida. Há situações, que conheço bem, onde o que está em jogo é uma pura vingança. «Ah, fizeste isto? pois vais ver se eu não faço aquilo!»
Se se conseguisse respeitar inteiramente o outro, estes 4 cavaleiros não apareciam.

Anónimo disse...

Ah, e quanto ao desenho, é de cortar o coração! Piada???? Qual a piada?!

Anónimo disse...

Se não estou enganada, conheço o livro a que te referes. Muito bom.
E por isso, pode haver quem te leia e olhe para a palavra «queixa» de um modo enviesado. Pode ler-se «queixa» no sentido de «queixinha» de choraminguice. E pelo contrário, é no sentido de esclarecimento.
O exemplo que ele dá, é claro. Perante um atraso, temos a Crítica «És muito egoísta! Nunca chegas a horas! Não tens consideração nenhuma!» e temos a Queixa «São 5 e tinhas dito que vinhas às 4. Sinto-me sozinho/a e aborrecido/a por ficar assim à tua espera»
Segundo ele, no segundo caso, pode haver uma conversa, uma análise dos motivos do atraso e dos sentimentos de cada um. No primeiro, a resposta tende a ser brusca, e de rejeição simples do facto.
Vê-se melhor assim, não é?

josé palmeiro disse...

Para Sábado, é muito pesado e ainda por cima no seguimento destes dias de festas, mas vamos a ele. Bem colocado e bem definido, tal como bem completado pela Joaninha. A falta de respeito mutuo, é a chave do problema, para o aparecimento, ou não, dos 4 cavaleiros. Aparecendo, é uma cavalgada sem fim.
Volto ao escrito do casamento para dizer à AB, que referi o Chico Ramos porque sou muito amigo dele, conheço-o desde os tempos em que era professor primário, sei do seu percurso e dos seus, magníficos trabalhos, bem como do seu posterior percurso universitário. Quanto ao São Carlos, à Cova Funda e a todos os outros, não me calei, só que, me casei ali porque havia uns primos da minha mulher, onde nós íamos muitas vezes, na Jorge Afonso. Quanto às minhas divagações nocturnas, iam mais para o Ritz Clube, Bolero, etc. Para mais a sério, ia-se à "Lareira", se a memória não me atraiçoa.

Anónimo disse...

E ainda há uma outra interpretação para o desenho «o marido (aceitemos que o é) está invisível para a companheira»
Aliás muitas vezes também as mulheres estão «invisíveis» para os maridos...

Anónimo disse...

O esclarecimento da Gui foi muito oportuno, eu vinha já a avançar no sentido que ela diz. A palavra 'queixa' irrita-me.
Não haverá outro modo de dizer?
Reclamação? Se há Livro de Reclamações, pretende-se que os casos aí expostos sejam objectivos, parece-me. Porque o que entendo é que na crítica não há objectividade, será?

Anónimo disse...

Então temos um amigo comum.Mas,Zé Palmeiro ainda não te apanhei...A "Lareira"é outra coisa e mais antiga.Tinha matinées,chás dançantes.Também tive amigos na Jorge Afonso e em todo o Bairro que na altura se dizia o Rego...Lá chegaremos.AB

Anónimo disse...

Por caso ninguém se lembra do monólogo do Cocteau para a Piaf chamado "Le Bel indiferent"?È que o desenho vai lá direito.AB

méri disse...

Xiiii!Há quantos anos me não lembrava da Lareira!!!Também a frequentei na segunda metade dos anos 60!!! Na Rua da Beneficencia só me lembro do restaurante da Tia Matilde que penso ainda existe

Anónimo disse...

A Tia Matilde ainda existe e é frequentada hoje fundamentalmente por gente do futebol e da publicidade.AB

cereja disse...

É verdade sim, "Le Bel indiferent"! E bem visto, este desenho é o desenho de «um monólogo»...
Obrigada pelo 'acrescento' Gui. Tiveste razão, sem essa explicação podia ser interpretado como «queixinha», no mau sentido.
RS, claro que essa interpretação também é possível.

AB e Zé Palmeiro, e já agora Méri, está visto que andaram pelas mesmos sítios mais ou menos ao mesmo tempo
;)

Anónimo disse...

Chego tarde e a más horas, sem tempo para comentar tudo como gosto.
Mas tinha de roubar um minuto ao que tenho de fazer para te dizer: que belo post!