sábado, outubro 13, 2007

Linguagens

Eu não resisto, volta e meia tenho de falar aqui em como é curioso o modo como a nossa linguagem reflecte os nossos conceitos e valores.
Creio bem que um sociólogo poderá estudar a «história da vida privada através dos tempos» analisando certas expressões comuns. Ando sempre a falar nisso, porque constantemente tropeço em expressões que me chamam a atenção.

Desta vez tem a ver com a forma como a sociedade olha para um casal e o seu filho. Nem é necessário abrir um romance romântico para encontrar a expressão «deu-lhe um filho» ou «de quem teve um filho» em vez de, como seria natural em qualquer projecto comum, - e o que pode haver de mais comum do que a concepção de um filho? – a frase ser «tiveram um filho».

É verdade que este último modo de falar também se usa, mas alguma coisa me choca nos outros dois casos.
DAR um filho? Mas «dar» como…? E mesmo a outra fórmula «de quem teve», se já não trata o bebé como um bem que se dá ou se recebe, também a perspectiva não é nada de igualdade de responsabilidades.
Acredito que quanto mais a sociedade for evoluindo, mais se irão esbatendo estas diferenças. Mas que por enquanto ainda são sensíveis, quanto a isso não pode haver dúvidas!

8 comentários:

Anónimo disse...

Hoje acordaste virada para o tema...
lol
Mas está bem apanhado. De facto diz-se «deu-lhe um filho» e olha que tanto é a mulher que «dá um filho» ao marido, como muitas vezes também se ouve que ele «deu um filho» à mulher.

josé palmeiro disse...

Como comecei por baixo, acho que respondi no comentário que deixei, há pouco.

Anónimo disse...

Realmente este post a seguir ao debaixo tem a sua piada. Mas o certo é que as tais expressões que referes estão na linha de que a criança «pertence» aos pais, é um bem, uma espécie de património.
Afinal, antigamente, os filhos eram a «pensão de reforma» dos pais. Quando não havia nada que se parecesse com «segurança social», na velhice sobrevivia-se porque os filhos cuidavam dos pais. Qualquer sociólogo diz isso, não é?
As voltas que o mundo dá!!!!

Anónimo disse...

Nos romances, como dizes, é mesmo uma expressão recorrente. Dão filhos como uma oferta.
Sem a menor dúvida que o que está ali é a criança como propriedade.
MJ

Anónimo disse...

São modos de falar...
Mas, como chamaste a atenção, reflectem também um 'modo-de-pensar'!

Anónimo disse...

De facto essa expressão tem algo de arcaico, é do tempo em que se suponha que a mulher era a única responsável pelo êxito da concepção, e coloca a mulher no papel conjugal de "parideira" e mãe. Mas concordo que os filhos eram, há 50 anos, um recurso familiar, daí também a expressão como uma espécie de oferenda prá subsistência.
Engraçado (apesar de não ter nada a ver), hoje utiliza muito, o sexo masculino, quando se referem aos filhos a propósito de algum comportamento menos conveniente, por exemplo, "a tua filha ainda não chegou?", "o teu filho não fez aquilo que lhe mandei?".

Anónimo disse...

Já agora e isso tb.tem a ver com o tipo de relações que hoje se estabelecem dantes dizia-se por exemplo "teve um filho de fulano ou fulana."..hoje substitui-se a proposição e diz-se teve um filho/a com fulano ou fulana.AB

cereja disse...

Mas repara AB que é de facto uma evolução. Até X e Y tiveram um filho, dizer «ter um filho com» é um avanço em relação a «ter um filho de».
Vamos andando. Devagarinho, mas lá vamos...
Leónidas, olha que essa do «teu filho» quando se está chateado é já outra coisa. É sacudir a água do capote... :))) «eu cá não tive nbada com isso; fez asneira é o teu filho»