sexta-feira, julho 06, 2007

As reformas por doença

Sou tão totó, que só recentemente quando os casos começaram a surgir na comunicação social, mostrando situações de pessoas gravemente doentes que foram consideradas aptas para continuar a trabalhar, é que entendi que afinal as Juntas que decidem desses casos de aposentação por doença, não são exclusivamente formadas por médicos . Sempre tinha pensado que sim!
Aliás, quando um «candidato à reforma» é chamado a essa Junta, não é para ser examinado, é para levar relatórios coisa que me parecia que qualquer pessoa poderia fazer.
Ontem uma familiar minha foi chamada a uma dessas Juntas.
Começou pela dificuldade do transporte. Como ela não consegue andar, foi necessário chamar uma ambulância, o que implicou uma verba de 90 €. Eu acompanhei-a, e ficámos à espera numa sala que já teria umas 20 pessoas. Aquela gente toda preocupou-me. Imaginei que ficaríamos ali horas e horas….
Mas fui metendo conversa com as senhoras do lado – a grande maioria eram mulheres – percebendo que algumas já lá iam pela segunda vez, porque a primeira Junta onde tinham ido as tinha devolvido ao trabalho, e percebi então que aquilo não devia demorar muito. A verdade é que o microfone chamava o nome do «candidato» que entrava por uma porta e ... (parecia uma cena de teatro - sai pela esquerda alta e entra pela direita baixa) logo depois saía por outra. Como nós tínhamos ido bastante mais cedo com receio dos atrasos no trânsito, esperamos um pouco, mas ela foi chamada quase à hora marcada.
Um funcionário empurrou-lhe a cadeira de rodas, ela desapareceu por uma porta e foi o tempo de eu caminhar até à outra, para voltar a reaparecer…!
- Então? quis eu saber.
- Entreguei-lhes o envelope com o relatório.
- E não disseram nada?
- Apontaram a cadeira e perguntaram o que me tinha acontecido.
- E tu?
- Disse que tinha dado uma queda.
E pronto. Aliás a minha prima deu a resposta errada à única pergunta que lhe fizeram. Não «está assim» porque deu uma queda. A queda foi há um ano. Deveria ter dito que «está assim» porque não consegue andar, e isso devido à sua doença neurológica. Mas, enfim, aquilo nem deve ter ficado registado, os senhores da Junta devem agora enviar os relatórios a quem os saiba interpretar.
Mas alguém me explica para que foi necessário a deslocação da doente ali?!

11 comentários:

Anónimo disse...

Olha, daqui do Porto tem que se ir a Lisboa, se se fizer um pedido de junta de recurso!
Quanto ao elemento não médico: este pode saber o que se passa com o doente, mas o próprio doente se quizer saber porque não lhe é dada a reforma, por outras palavras, saber as razões médicas da recusa, tem que nomear um médico para obter essa resposta. Das "razões médicas" nem comento.
(este é um assunto que me é muito sensível! precisamente nesta altura)

cereja disse...

Méri, a minha sensação é de estar a viver denro de um dos romances de Kafka! O nada ter lógica, ou pelo menos a «minha lógica».
E com toda a franqueza considero que há uma completa falta de respeito pelas pessoas. São material de trabalho e ponto parágrafo.
(Nem calculava que essa Junta de Recurso fosse em Lisboa, calculo que para todo o país! que miséria)

Anónimo disse...

É chocante.
Reparem que quem se reforma antes do tempo só tem prejuízo - vai receber menos do que recebia até então. E se se reforma por doença, calculamos que tenha mais despesas, pelo menos em remédios.
Porque é que se tratam estas pessoas como possíveis vigaristas, que pretendem uma benesse a que não têm direito?!
Este teu post, cruzou uma notícia com uma vivência pessoal, está excelente.

Anónimo disse...

Esta argumentação tem toda a lógica, mas houve no passado (e passado recente) muita reforma fraudulenta, mesmo com pouco tempo de serviço, indo muitas vezes trabalhar para instituições privadas exactamente a fazer a mesma coisa; havia e ainda há muitos simuladores, mas para isso é que seria a junta para "avaliar"
Pode haver uma doença não compatível com a sua profissão ou tipo de trabalho;
o que penso é que se passou do oito para o oitenta ou vice-versa

Anónimo disse...

Estava a ler o teu post, que é de um grande «colorido» - estou mesmo a ver o rodopio do entra por uma porta e sai por outra - e a pensar as duas coisas que a Joaninha e a Méri já aqui disserem. Por um lado, quem se reforma antes do tempo invocando doença, é à partida alguém que não só não está bem como precisa ainda de mais. Mas também conhecemos casos, como disse agora a Méri, de pessoas que pedem a reforma para se dedicarem a outra actividade, se calhar mais vantajosa. Ora isso é que devia ser avaliado mas com todo o rigor. Em muitos casos até se poderá pedir uma «licença sem vencimento» para se dedicar a outra tarefa e não de imediato uma reforma. Contudo, há pessoas verdadeiramente doentes para trabalharem seja no que for e esta actual «caça às brulhas» é o 80 de que fala a Méri

josé palmeiro disse...

Aqui no comentário é que dizes tudo: "Estamos a viver num mundo kafkiano!". Tudo o que se acrescentar, a nada leva, porque nem vale a pena. O certo, era virar tudo, de pernas p'ró ar!

cereja disse...

Raphael - realmente «calhou» eu ter reparado nesta notícia ainda no rescaldo da tarde de ontem.
No caso da minha prima nem imagino o que seria mandarem-na trabalhar...!!! Ia todos os dias de ambulância? Gastar 90 € por dia para ganhar menos de metade disso? E lá no trabalho, quando nem consegue segurar numa colher ou seja num lápis, ia fazer o quê?
Penso que cada caso seja diferente, e se há situação que devia ser analisada com muito cuidado e respeito, é esta da reforma por doença. Partir-se do princípio (mesmo que haja casos desses) de que quem a pede é vigarista, parece-me quase um insulto.

saltapocinhas disse...

junto-me ao grupo das totós: eu tb pensava que eram médicos que viam os doentes...
Quem está totó é quem põe as juntas a funcionar sem médicos!

Em relação a obrigarem as pessoas a ir lá, ainda hoje uma colega comentava que uma amiga, grávida e sem poder sair da cama para ver se leva a gravidez até ao fim (já perdeu 2 bebés) tem de se levantar e viajar para ir à junta médica!!

cereja disse...

Saltapocinhas, imagino que as «outras» Juntas, já que se chamam «juntas médicas» devam ser mesmo constituidas por médicos. As da ADSE, ou as que confirmam as baixas como a da tua colega de bebé, devem ser. Neste caso que eu falei, como é para conceder ou não a reforma devem pôr lá gestores ou economistas ou sei lá. Eu calculo que recebam o relatório (que a minha prima levou em envelope fechado e tudo) e peçam então o parecer médico.
Se calhar os médicos dizem «esta pessoa tem uma doença que não o deixa manter em pé» e eles então pensam «ok, como empregada de limpezas não serve, mas pode continuar a trabalhar sentada numa mesa a lamber selos e a pôr carimbos».

Sinto-me muito azeda, porque se regateiam umas reformas de poucas centenas de euros, e depois sabemos que os gestores XPTL, recebem umas reformas de milhares de euros, ainda de perfeita saúde...

Margarida disse...

pOIS É PASSEI POR AQUI POR ACASO E E TAMBÉM ME DIZ RESPEITO.
QUANDO SE FICA DOENTE TEM DE SE APRENDER A SER DOENTE: QUER DIZER NINGUÉM SABE NADA.
ACONTECEU COMIGO QUE INFELIZMENTE SÓ SEI TRABALHAR E QUE ME CUSTA IMENSO ESTAR ASSIM INCAPAZ PARA O FAZER, FUI CURIOSAMENTE ONTEM A UMA JUNTA DITA MÉDICA, ENFIM ESTÁ TUDO DITO, PASSARAM DO 8 PARA O 80.
GUIDA

cereja disse...

Guida - a net e os blogs têm destas coisas, a gente vai apanhar algo que aqui se escreveu já há muito tempo. Eu tive de vir aqui ler o post para perceber a que se referia o teu comentário.
Este caso e tremento e chocante. A pessoa a quem me refiro aqui, e que realmente teve a reforma, nem a pôde gozar. Isto foi escrito há um ano e meio e ela faleceu já há mais de um ano!...
Fala-se muito em que a «esperança de vida» aumentou e há muitos reformados, mas também há muitos e muitos (eu conheço tantos!!!!) que acabam por gozar poucos meses de reforma.
Desejo do fundo do coração que saibas aproveitar bem a reforma que te derem (foi o que entendi) e olha que uma pessoa pode estar reformada e ainda fazer muita coisa útil!