quarta-feira, abril 25, 2007

Onde estavas na noite do 25 de Abril?


Chegámos à noite a casa, eu e a Marta, completamente extenuados. Cansadíssimos os dois, e ainda debaixo de choque. Ainda nos custava acreditar. Na nossa vida tinha ficado para trás muitos anos de luta activa, desde a crise académica de 62, onde nos conhecemos e começámos a namorar. Dessa época ficou a «greve de fome» feita na Cantina, a prisão em Caxias. Qualquer de nós tinha conhecido como era uma cadeia por dentro…
A nossa vida tinha sido muito difícil até então. Sempre que nos candidatávamos a um emprego, apesar de licenciados, a má informação da Pide tinha-nos bloqueado as hipóteses de um trabalho de jeito. Aquele dia foi vivido como um sonho. Voltámos a casa estoirados, cansadíssimos, e fomos enfiar a nossa filhota na cama, que também ela se sentia contagiada pelo ambiente de excitação.
Mas a porta ia ficando aberta para os muitos amigos que iam aparecendo. E foram imensos os que se juntaram na nossa casa, onde improvisámos um 'jantar' - havia pão, ovos, queijo, chouriço, vinho e cerveja, não era preciso mais! Cada qual que chega trás notícias, boatos, nem se sabe bem o que é a verdade e o que são os nossos desejos… - Eh malta!! Shee!!!!Tudo calado, vão dar as notícias na TV!!
De súbito aparecem as imagens da Junta de Salvação Nacional . Ai!O quêêê??? Desaparecem os sorrisos, passa um arrepio, um momento de susto. Spínola, Galvão de Melo, Pinheiro de Azevedo, Silvério Marques e Rosa Coutinho. Ali, até mesmo o Rosa Coutinho parecia ter má cara! Naquela sala tão animada e feliz sentimos passar uma aragem fria… Foi a primeira desilusão do dia, mas em breve ultrapassada. O Zé Pedro, optimista, acha que aquelas imagens são necessárias para tranquilizar as pessoas mais assustadiças. “Vamos animar, malta, olhem que quem controla o Movimento não são ‘estes’!” e de novo o tom das conversas sobe, planos, sonhos, enchem de entusiasmo o nosso grupo, igual a muitos outros espalhados àquela hora por todo o país.
Ninguém tinha sono, quem conseguia dormir na noite de num dia assim?...


8 comentários:

Anónimo disse...

Eu sabia :))) Já conheço o teu estilo! Tinhas de 'acabar a série' com este final.
E mais uma vez esta parte da história fez reviver o meu dia. também eu e a minha namorada fomos para casa de uns amigos casados para viver em conjunto estes momentos e ver o que dizia o telejornal, ou equivalente. São momentos em que se tem de estar acompanhado. E, tal como dizes, aquele quinteto da Junta de Salvação foi muito mal recebido. Até o nome chocava. Junta??!! De salvação? Quando a gente achava que tinha sido salvo aparecem aqueles caramelos, com um ar pesadíssimo (e a tv a preto e branco intimida ainda mais!)
Mas como aqui dizes, sentimos logo que havia «alguém» atrás daqueles senhores, afinal os oficiais do MFA, sigla que ainda era dita com admiração.
Grande noite, malta!

Anónimo disse...

Bela série, na verdade!
É tudo tão comovente! Ao fim de 33anos.
Obrigada, Emiéle!

cereja disse...

Pois tá claro, King! Não é que seja o 'meu estilo' lol, como disse por aí alguém (creio que a Joaninha) estes posts vieram do ano passado, estão apenas de vestido novo. E no ano passado escrevi estes 5, um para cada altura do dia, de manhã à noite. Achei piada, recuperar a frase do Baptista Bastos que se tornou famosa.
Ainda bem que te reviste nestas historiazinhas, afinal verdadeiras

Liv Araújo disse...

Emièle,
respondendo ao teu quiz sobre como eu vejo o 25 de abril, minha resposta está lá no meu blog brasileiro!
Dou os parabéns ao teu povo e ao teu país, pois uma revolução como essa, a mim me reserva as referências mais doces e emocionantes. ;-)

Trilby disse...

VIVA o 25 de ABRIL!

Sabes que também tenho o comunicado do MFA lá no meu estaminé. Até parece que andámos na mesma escola :)

cereja disse...

Olá Lívia! Gosto muito quando passas por cá. Vou agora ao teu blog.
Trilby - Sabia porque passei por lá! Também achei engraçado. E não foi combinação!!!! Eu quis a Marcha do MFA (Tá tá tárá tá tá...) porque achei que era o que mais me lembrava este dia em especial. Depois pensei que a declaração e a música ficava perfeito - achei muita piada quando vi o teu.

Anónimo disse...

Na manhã do dia o meu filho mais velho apareceu na sala de pijama a esfregar os
olhos e a perguntar ao ouvir a marcha "está o circo à porta"?Mais tarde já em plena campanha Otelo ao dar uma volta pelo país encontrei um circo com o nome de MFA.Hoje o circo estendeu-se tanto que quási abarca o país inteiro e como se não bastasse recorreu aos clássicos...infelizmente sem cicuta...Esse estaria a brincar aos engenheiros no 25 de Abril?.AB

cereja disse...

Tanto quanto penso saber, amiga AB, para o teu filho chamar «circo» seria um elogio. Não me esqueço nunca da vez em que te viu a tratar da maquillage. toda produzida e declarou embevecido: «Mãe! Tás tãããõ linda!!! Pareces um palhaço!» donde era um belo símbolo. :)))