quarta-feira, março 07, 2007

Cinquenta anos

Todos os portugueses que tenham cinquenta anos ou menos não sabem o que é a vida sem TV.
Nem estou a falar da grande quantidade de escolha de canais que temos com televisão por cabo nem, mais para trás, da televisão a cores, falo simplesmente de as notícias serem conhecidas apenas pela imprensa ou rádio, e as distracções em casa também se limitarem a essas duas fontes – para além da leitura é claro e do convívio social.
Mas um adulto de hoje, encara aquela caixa – que já não é pequena, pode ser bem grande! –até como o que de mais importante tem em casa. As salas de estar organizam-se hoje em dia em redor do aparelho de televisão como nos séculos passados em redor da lareira. Muitas vezes ao chegar do trabalho, num gesto quase automático, liga-se mesmo que nem se preste atenção ao que lá se está a passar. Aquele som serve de companhia. É o entretêm das crianças (alguns pais nem imaginam como seria no tempo em que não existia TV para elas estarem sossegadas…) e a descontracção do adulto.
Pois a nossa televisão nasceu há 50 anos. Uma experiência, ainda a necessitar de ajustes, com a imagem a preto e branco, e horário limitado. Pela meia noite o locutor de serviço despedia-se «Até amanhã, se Deus quiser» via-se uma bandeira nacional e ouvia-se o hino. E pronto, tudo para a cama que no dia seguinte era dia de trabalho.
Parece que foi há séculos!
Neste período o que ela cresceu! Hoje para a quase totalidade das pessoas é um dos objectos mais importantes de casa. Estamos ligados ‘em rede’ televisiva. Quantas vezes não se recebe um telefonema «olha, liga depressa para o canal tal» quando está a passar qualquer coisa que depois queremos discutir, e quando se dá um acontecimento importante no dia seguinte no local de trabalho é analisado em pormenor muitas vezes não o caso em si mas aquilo que dele se viu… Passamos a estar ‘formatados’ por o que essa «caixa» nos envia e que naturalmente aceitamos como sendo a verdade. Por outro lado, quem se desliga da ‘rede’ cai numa certa exclusão. Se não se viu a telenovela que as nossas amigas vêm, as suas conversas ou piadas deixam de fazer sentido e sentimo-nos um pouco perdidos.
O mundo mudou muito. A informação chega no minuto exacto, desactualiza-se rapidamente, e essa sede de novidades faz com que muitas vezes assuntos importantes sejam postos de lado sem se aprofundarem porque chegou um outro mais actual, seja ou não tão importante.
É um excelente meio de comunicação, tem muitíssimas vantagens, mas terá de ser domesticada - não deixarmos que mande em nós e sermos nós a decidir o nosso caminho.

8 comentários:

josé palmeiro disse...

Oportuníssima a tua reflexão. É assim mesmo que a caixa funciona, nos invade e nos condiciona. Mas hoje, eu que assisti, na então Feira Popular, de calções ainda, às emissões experimentais, quando dos cinquenta anos, e o sinal chegou às nossas terras, era um "ver se te havias". Os cafés cheios a ver televisão, um desastre para os cafés, porque, um cafézinho ocupava uma mesa a noite inteira, eram as sociedades recreativas, com os seus salões de baile, transformados em plateias de cinema, e as salas de cinema às moscas, enfim, era um outro tempo, com outro ritmo, mas mais um meio de domesticar sociedades, sem que as sociedades, tenham, nestes cinquenta anos arranjado o antídoto, para inverter a situação.

Anónimo disse...

O mundo já mudou tanto em 50 anos , mas se pensarmos que tanta evolução começou nos finais do sec XIX , como será nos proximos 50? Gostava de saber mas não saberei.Seria muito dificil para mim viver sem tudo isto que me rodeia, sinto-me dependente e controlada e a Emiéle tem toda a razão no que diz na parte final do seu texto.

Anónimo disse...

É realmente difícil imaginar o Mundo sem a TV. É espantoso como nos condicionou tanto, quer se goste quer se critique o certo é que giramos em volta do que ela quer. E o irritante é que quer quiser fugir completamente entra num mundo meio autista. Podemos (e devemos quanto a mim) seleccionar o que se vê, mas não podemos não ver de todo.

Anónimo disse...

Cá vem um «filho da TV» que nem imagina como é passar-se sem ela! Se eu já sem imagino passar sem telemóvel! E essa do 'a preto e branco' parece uma cisa da pré-história.
Os locutores despediam-se a dizer «Boa noite, até amanhã» no fim do programa, assim, tão familiar??? Nos telejornais também, mas é diferente, não «fecha» a televisão !

Anónimo disse...

Olha Raphael, como eu «sou do tempo» e lembro-me de muita coisa como o Zé Palmeiro, sei que a frase tinha de ser «Boa Noite e até amanhã, se Deus quiser
Esta parte do «se Deus quiser» era fundamental. Houve alguém que apanhou um processo e nem sei que consequências teve porque não dizia a fórmula dessa maneira (se calhar era ateu!)
Aquilo era um tempo de muito respeitinho!

Anónimo disse...

Cinquenta anos é meio século.
Muito, muito tempo. Mesmo os portugueses mais velhos, que quando nasceram ainda ela cá não estava agora já se habituaram.
Posso dizer que não há casa sem televisão, já tenho visto fotos de algumas barracas, ou casas degradadíssimas, mas a tv lá está!

cereja disse...

Mas eu não acho que a TV seja um mal. Para mim é um instrumento que como tal pode ser usado para o bem e para o mal. Pode manipular-se as pessoas com todo o descaramento, e nesse caso é mal é claro, mas pode mostrar coisas formidáveis, pode educar, pode fazer-nos viajar, podemos ver espectáculos que nunca veríamos!
O que é francamente mau é a «dependência» pior do que uma droga. Aquela coisa que disse da telenovela é verdade. Eu não vejo nenhuma telenovela, mas às vezes pareço uma snob e não gosto da sensação.

contradicoes disse...

Por mais que queiramos acabamos sempre por abordar os mesmos temas face à sua actualidade. Quanto à comemoração dos 50 anos de emissões da RTP, escrevi que esta estação de televisão pioneira em Portugal, enveredou por um mau caminho imitando as televisões privadas, estragando assim bons programas que antes da concorrência nos proporcionava.