segunda-feira, fevereiro 19, 2007

Emprego e filhos

Aqui está um ponto que só foi aflorado ao de leve na campanha do último referendo (e é normal que assim fosse uma vez que o que estava em discussão era uma questão jurídica ) mas que é da maior importância e ajuda muito a enquadrar uma das causas da baixa natalidade em Portugal – a pressão que uma mulher sente por parte do seu patrão contra o facto de ser mãe ou o desejar ser.
O JN dá-lhe a primeira página e ainda bem. Porque esta é uma questão muito delicada e onde as queixas são difíceis.

Estamos a falar da discriminação da mulher em função de vir a engravidar ou até mesmo por ter filhos pequenos.

Para além de ser delicado apresentar queixa, admitindo em seguida que a trabalhadora discriminada prova o seu caso e o patrão a tenha de admitir novamente, não é difícil imaginar os milhares de pequeninas vinganças a que será submetida depois dessa readmissão forçada…! Uma empresa que se veja obrigada a readmitir uma mulher despedida por ter engravidado, tem o queijo numa mão e a faca na outra para hiper-valorizar a menor falta cometida e infernizar o quotidiano dessa mulher mantida no posto de trabalho contra a vontade do patrão. E o que a IGT diz agora neste relatório, já nós o sabíamos pelo que se vai ouvindo no dia a dia: isto acontece "em todos os sectores da vida económica". Sem falarmos no mundo imenso do trabalho precário, onde a questão nem se põe porque logo de início, se está grávida ou com um bebé pequeno a mulher nem sequer é aceite, muitos de nós conhecemos casos de mulheres que trabalham em sectores mais qualificados e são penalizadas se acontece engravidarem. Eu tenho duas amigas bancárias que me contam situações inacreditáveis de intromissão na sua vida privada. Nem sequer pelo chefe máximo mas por quem está mais perto delas e sente que a produção no seu sector pode diminuir!
Assim como posso contar uma história, passada na própria função pública que deveria dar o exemplo nestes casos: uma rapariga, já funcionária, pediu uma transferência para secretária de uma chefe que precisava de alguém com as suas qualificações. Vi a expressão dela ao sair da entrevista, e era aterrorizada quase à beira da lágrima. «Mas o que foi?» quis eu saber. «Ai, meu Deus! A Dr.a X disse-me que para aqui só queria mulheres na menopausa ou com trompas laqueadas». Rodeamos a moça e tentamos dizer que aquilo era uma brincadeira. E é claro que só podia ser uma brincadeira, mas de muito mau gosto.
E sintomática de como as coisas se passam.

9 comentários:

Anónimo disse...

Hoje o Pópulo está menos «produtivo»... Será o Carnaval?
:D
Mas o teu post não tem nada de brincadeira. É muito, muito sério. Por um lado é verdade que uma empresa quer um empregado que produza, e uma mulher que anda «a produzir um filho» não é uma empregada normal... Por outro, é uma tremenda injustiça porque ela precisa de trabalhar, e tem o direito a fazê-lo.
É uma pena as tarefs da maternidade não poderem ser mais divididas com os pais-homens. A gravidez em si, claro que é biológicamente impossível, mas o resto, talvez. Se quando um filho adoece fosse o pai que ficasse em casa, talvez esse carimbo de «faltosa» que as mulheres têm começasse a ficar diluido.

ilha_man disse...

Concordo quando a Joaninha diz que as tarefas paternais devem ser mais divididas entre eles e elas. Conheco um empresário que se queixa de o governo o obrigar a pagar uma taxa para a ajuda do infantário dos filhos das suas empregadas e que quem tem empregados, mesmo com filhos no pré-escolar, nao paga essa taxa. Defende ele que esse subsídio deveria ser pago em conjunto por quem emprega a mae e o pai.

Anónimo disse...

De tão sério e verdadeiro, só posso dizer que é mesmo assim e agora, sem subtilezas, antes com a crueldade necessária e suficiente para deixar a interlecutora, "à beira de um ataque de nervos".
É vergonhoso, ainda por cima, num país, com graves carências populacionais, a discriminação a que são votadas as mulheres, que decidem, por sua livre e expontânea vontade, engravidar e contribuir para o rejovenescimento do país, que dizem, ser o seu.

Anónimo disse...

Que chamada de atenção importante e necessária. Porque o debate sobre a IVG, já foi. Isso é uma questão, triste, infeliz, que cada um tenta resolver como pode. Mas é importante ver a «outra face da moeda» os que querem ter filhos e o muro de dificuldades que têm de transpor.
Concordo muito com o que diz o ilha_man: a verdade é que uma criança tem pai e mãe, os dois são responsáveis por ela. A verdade, seguindo a tua linha de pensamento, quando se entrevista um rapaz não é costume perguntar-lhe se pensa em casar e ter filhos... Why not?!

Anónimo disse...

Respondendo à Mary: Porque na nossa sociedade isso não vai aquecer nem arrefecer o rendimento do funcionário! Terá de passar muita água debaixo das pontes!!!
Contudo o ponto que aponta o ilha_man é sugestivo. Nesse caso não há a menor razão para ser a taxa para o fundo das empregadas - mulheres, quando eles também são pais!

cereja disse...

Gui, olha que talvez a mudança seja mais acelerada do que nos parecia. Hoje já vejo muitos jovens pais a tomarem parte na educação dos seus filhos, mesmo bebés, coisa que a anterior geração não fazia. Acredito que dentro em pouco as tarefas estejam mesmo equiparadas e portanto tirando a gravidez, que não é uma «doença» podemos muito bem trabalhar se não for trabalho demasiado pesado, deixa de haver razão para descriminar a mulher por ser mãe.

Anónimo disse...

Por acaso tens muita razão nos exemplos que dás. Temos a ideia de que são só trabalhadoras desvalorizadas mas isso passa-se por todo o lado e tal como aqui dizes até muitas vezes são os chefes mais próximos (que não são «tão-chefes-como-isso») que puxam dos galões para chatear.
Essa moça que ouviu a frase que contas deve ter ficado estarrecida! E é das tais coisas que nem daria para se queixar. É mesmo perverso!

saltapocinhas disse...

Desta vez estás completamente equivocada: não há bebés suficientes porque ganhou o "sim"!

cereja disse...

Upss! Ó Saltapocinhas, não é que me tinha esquecido??? Tá visto. A culpa é dessa gente desnaturada e sem entranhas.