sábado, janeiro 06, 2007

Quando a ‘violência doméstica’ muda de género

A história é toda ela um nadinha caricata, porque os protagonistas já não estão na ‘flor da juventude’ e porque as agressões afinal nem deixaram grandes marcas. Nem devem ter sido coisa assim muito, muito grave porque a notícia diz por um lado que «com a chegada da polícia a situação agravou-se» mas acrescenta em seguida que «a mulher voltou a agredir o marido, já na frente dos polícias, desta vez com duas bofetadas» donde se pode pensar que menos grave que as duas bofetadas deviam ser os gritos que os vizinhos ouviram.
Contudo devemos levar a história a sério por duas coisas. Primeiro acho muitíssimo bem que, finalmente, os vizinhos comecem a «meter a colher». Está a acabar a noção de que 'o que se passa dentro das pareces de uma casa é lá entre eles'… Até que enfim! Quando existe violência, seja lá onde for, deve ser estancada. E depois porque aqui se notam bem as armas femininas, que raramente passam pela agressão física, mas não devem ser esquecidas. Uma mulher pode exercer uma violência aparentemente «de 2ª» mas também grave: contra filhos, idosos, ou – evidentemente – contra o marido. Passa pelo modo como se dirige a eles, aos gritos, com maus modos, com palavrões, passa por ignorar as suas carências ou necessidades, passa, por aquilo que pode doer muito, uma atitude de indiferença e silêncio.
Focando o caso das crianças, muitas e muitas vezes, elas até recebem comida, roupa e uma cama onde dormem, mas falta outro importante alimento: o carinho, a atenção, um lugar definido naquela família.
E isso pode ser uma violência, sim. Só que as marcas são outras.

8 comentários:

Anónimo disse...

Hoje estou cheia de pressa, passei por aqui só por vício, mas este post merecia um comentário alargado. Se calhar fica para amanhã.
É que pôes o dedo num ponto muito sério: a agressão pode não ser só física. É certo que a agressão física acumula os dois aspectos porque também doi psicológicamente, mas podemos magoar imenso alguém sem lhe tocar com um dedo... O caso das canças e velhos que focas aqui é um deles. Quando os «ignoramos» quando nos «esquecemos deles» é uma agressão e doi muito.

Anónimo disse...

Muitas são as agressões do foro psicológico que, como vocês dizem e bem, causam dores muito mais profundas e duradouras do que muitas das agressões físicas. Quanto à agressão física pura e dura, é inacreditável a quantidade de mulheres que batem neles. Então cá é um ver se te avias. Nunca imaginei! Mas batem a sério mesmo!

Anónimo disse...

Oh Miguel!!!! A sério?! E eles 'ficam-se'?????
Bom, o certo é que a Emiéle disse uma coisa que faz pensar - a agressão «não física» não se pode desvalorizar. E, de facto essa é mais feminina. Coisa chata!

Anónimo disse...

Não concordo com a expressão "as agressões psicológicas são mais profundas e duradoiras que as físicas".Todos nós desde crianças somos agredidos psicológicamente por coleguinhas, mais tarde por estranhos ou por pessoas que se cruzam no nosso caminho quer a nivel profissional quer a nível pessoal e familiar.Fortalecemos com essas dores.Perguntem a uma mulher que está paraplégica porque foi agredida pelo marido qual a dor maior?
Às que já morreram não podemos perguntar porque já nem têm uma vida, com dores psicológias ou não.

Farpas disse...

Há de tudo... isto é mais um exemplo do que se passa às escondidas!

Célia, tens razão, mas o problema é que as agressões físicas são muito mais fáceis de identificar e, por isso, é mais fácil intervir, quanto às psicológicas...

cereja disse...

Célia, desta vez não concordo contigo apesar de, creio, identificar onde é que a coisa não bate certo. Falas de «agressões» de colegas de escola, de estranhos ou pessoas que se cruzam na nossa vida. Ora comparar isso com uma agressão grave de uma mulher pelo seu marido, a pontos de a deixar paralítica ou matá-la estás a falar de grandezas diferentes. Essas terríveis violências domésticas, já aqui as referi muitas vezes com a maior indignação e não têm qualquer desculpa - nem o ciúme, nem o alcool, nem coisa nenhuma. Isso são crimes, pura e simplesmente.
Contudo as dores que «nos fortalecem» como dizes são de outra dimensão. Se comparasse, essas dores estariam como a palmada no rabo de um miúdo para a mulher espancada.
Eu estava a falar de violência psicológica a sério. Na escola, o fenómeno do bullying por exemplo; numa família a mãe que ignora as necessidades mais básicas de afecto. Conheço uma mulher que nunca conseguiu dar um beijo à mãe, a não ser uma vez em que ela estava mais perto, mas a mãe pegou logo num lenço e limpou a cara. Eu conheço várias histórias deste tipo, e magoam muito.

Anónimo disse...

É verdade Farpas e também tens razão Emielie quanto a acontecimentos que magoam profundamente o ser humano. Se calhar sou mais sensível à agressão física por já a ter presenciado, não sei.

cereja disse...

Com certeza que se assististe a cenas dessas ficaste mesmo marcada Célia (e foi «só» assistir, o que seria se tivesses sido a vítima!!!) e entendo isso muito bem.
Aliás esse é um tema recorrente aqui no Pópulo. Nunca me hei-de cansar de dizer que é uma vergonha e tem muito a ver com as mentalidades ainda tão tradicionas e antiquadas da nossa gente, o aceitar-se de um modo tão «resignado» que um marido agrida a sua mulher!!!
Ainda este fim de semana vi um série (creio que era série) passada há umas décadas, onde uma mulher estava a ser julgada por ter morto o marido. Após uma brutal agressão dele, ela deu-lhe um forte emburrão, ele caiu e partiu a cabeça morrendo. Ao contar a história, que desde o primeiro ano de casamento era espancada, perguntavam porquê, e como ela contava 'por se ter esquecido de fazer qualquer coisa' o advogado insistia: «mas era só quando merecia»? E ela lá dizia que nem sempre «merecia»