segunda-feira, janeiro 22, 2007

O factor S

Já em tempos, a respeito de um excelente filme «A Melhor Juventude», falei aqui de um médico que ao ser classificado pelo seu professor, teve a sua nota de curso melhorada, por possuir aquilo que o sábio professor classificou de factor S = Simpatia. Dizia esse professor que para exercer medicina, tanto ou mais do que os conhecimentos, importava sentir simpatia pelo doente.
Lembro-me muitas vezes disso, pela frequência com que acontece a ausência ou presença de esse factor, que não custa dinheiro nem se ensina: sente-se.
A saga da minha prima continuou. Mais uma vez voltou a uma urgência de hospital. Operada a uma fractura do colo do fémur há 15 dias, teve alta e em casa foi seguindo as orientações do médico – fisioterapia 3 vezes por semana. Hoje queixou-se da perna, inchadíssima, e a enfermeira que a visita foi de opinião que devia ir já ao hospital onde foi confirmada uma trombo-flebite.
Escuso de contar que mais uma vez teve de passar pela urgência com o seu rastreio, de esperar horas, da dificuldade do atendimento porque isso, já todos nós sabemos, faz parte da história. O que queria contar foi que o médico importante que finalmente a atendeu, num tom agressivo, frio e desagradável a acusa: «Pois! A senhora não se mexe, e agora está neste estado!» A doente, pessoa muito tímida, nem dizia palavra, mas a irmã que a acompanhava explicou que ela tinha seguido a orientação do hospital, fisioterapia 3 vezes por semana. Novo surto de irritação do médico «Isso não é nada! Ela devia era sair da cama. Há senhoras de 80 anos que vão para casa, se sentam sozinhas e começam a andar! A sua irmã tem 50, devia fazer isso e muito mais» Lá se recordou ao senhor, que apesar dos 50 tinha um ‘parkinson’ grave pelo que a mobilidade estava reduzida. Ele encolhe os ombros «Não tem nada a ver! Não se mexe porque não quer» e ao explicar-se que havia momentos em que nem conseguia levantar a cabeça da almofada, ouviu a resposta «Ela anda com as pernas não é com a cabeça»
Conclusão óbvia: a culpa de estar doente é do próprio doente, e deveria até ser castigada. Temos a sensação de que se pudesse era o que fazia.
Esta criatura tinha um forte factor A (antipatia) Se tivesse sido aluno do outro chumbava decerto.
Que pena não ter sido...

12 comentários:

Anónimo disse...

Chamas-lhe Saga, e olha que bem pode ser... Não há nada que não aconteça a essa desgraçada! Uma tromboflebite!!!
Quanto á atitude do «excelentíssimo senhor professor doutor» é bem signifoicativa do respeito que pode haver por alguém que está em sofrimento. Conhecemos tantos casos desses. E a malta 'amocha' e aceita tudo...

Anónimo disse...

A saga é incrivel o médico pior, se possivel. Julgo que nem se pode comentar em portugu^s decente.fj

josé palmeiro disse...

Oportuno o teu escrito!
Um profissional de saúde que assim procede, deve ser chefe, de qualquer coisa, e de certeza que, ao ser avaliado, tem condecoração pela certa, cumpre os desígnios do ministro. Doentes nos hospitais? Ainda por cima acamados?
Doentes que não se levantam e caminham pelo seu próprio pé, com destino ao cemitério, deverão pagar, pelos trabalhos e incómodos que dão à sociedade. Enfim um desenrolar de conjecturas, que só justificam o nosso mal estar e descontentamento.
Uma atitude digna de figurar num LIVRO DE RECLAMAÇÕES. Pode não dar nada, mas fica lá, se não arrancarem a folha!

Anónimo disse...

Vinha dizer o mesmo que o Zé. A gente tem de aprender a reclamar! É claro que o senhor-professor-doutor diria que o reclamante estava histérico, que o tom que usou até foi carinhoso, etc, etc, e como ess coisas não são filmadas são difíceis de provar. Mas ao menos ficava o registo!

Anónimo disse...

Emiele, este post tocou-me particularmente, porque já ouvi a mesma frase, num post operatorio onde me deixaram sofrer horrores e foi no hospital privado...isso só tem a ver com a sensibilidade ou falta dela dos profissionais de saude.Psicologicamente faz- nos muito mal pois até o meu sistema imunitário ficou afectado pelo trauma. Concordo que de viamos reclamar mais, mas na altura estamos tão fragilizados que o qe mais queremos é sair desse inferno
Desejo as melhoras da tua prima

Farpas disse...

Sabes que isso passa um pouco pelo sistema de ensino que temos e aquela coisa do "tem boas notas vai ser médico"... assim se perdem muitos possíveis bons médicos e se ganham muitos maus médicos...

As melhoras!

saltapocinhas disse...

Devia ter chumbado, mas infelizmente não chumbou...
A irmã da tua prima não tinha nada para lhe atirar à cabeça?
Se eu apanhasse um médico desses à frente, grrrrrrrrrrrrrrrrrrrr

cereja disse...

Olha os meus comentadores da noite, hoje madrugaram!!! o Farpas e a Saltapocinhas a esta hora...?!

Pois é, meus amigos. As notas altas e os conhecimentos académicos não são tudo. Aquele sujeito merecia uma 'sacudidela' porque não se responde assim a ninguém, muito menos a uma pessoa que está a sofrer e assustada.

cereja disse...

Esqueci-me de dizer que o senhor era um 'chefe' qualquer, sim senhora (bom exemlo, heim..!) Hohe fui lá à hora do almoço, ao S.O. e falei com outro que era uma criatura normal e cordato...
Mas, a propósito, descobri porque é que as visitas do S.O. são ao meio-dia - é que corresponde com a hora do almoço e assim fui eu que dei a sopa à minha prima e eles pouparam o trabalho de uma assistente!!!! E quem diz eu, os outros visitantes todos.

Anónimo disse...

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Anónimo disse...

Parece uma história, O médico e o monstro, mas não é. Difícil sobreviver à crueldade dos muitos desumanos que escolheram a carreira, mas não a vocação. Questão de contabilidade..

cereja disse...

É verdade, Inês. Uma coisa é a profissão vista de um ponto de vista científico. Podem ser excelentes cientistas. Mas a verdade é que a medicina não é exactamente engenharia, a parte «relação humana» é parte do caminho, direi até parte do sucesso, da cura.
Mas nem toda a gente pensa assim, infelizmente...